Bem Vindo ao Blog do Pêga!

Bem Vindo ao Blog do Pêga!

O propósito do Blog do Pêga é desenvolver e promover a raça, encorajando a sociedade entre os criadores e admiradores por meio de circulação de informações úteis.

Existe muita literatura sobre cavalos, mas poucos escrevem sobre jumentos e muares. Este é um espaço para postar artigos, informações e fotos sobre esses fantásticos animais. Estamos sempre a procura de novo material, ajude a transformar este blog na maior enciclopédia de jumentos e muares da história! Caso alguém queira colaborar com histórias, artigos, fotos, informações, etc ... entre em contato conosco: fazendasnoca@uol.com.br

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Asininos: animais com características sociais e reprodutivas próprias 4

Comportamento sexual de jumentos cobrindo éguas a campo

Neste item em particular, muito se conhece pela experiência dos próprios criadores e incentivadores da produção de muares, sendo escassas as informações oriundas de estudos direcionados para este fim. Está claro que, para um jumento cobrir éguas, há a necessidade de ele ser submetido a um período de condicionamento. A época do condicionamento mais defendida pelos adeptos deste sistema de produção seria na juventude quando, após o desmame, o jovem jumento seria criado até atingir a idade adulta na presença exclusiva de potras. A maioria dos práticos ressalta a necessidade de iniciar o condicionamento ainda na fase de crescimento do jumento. Na verdade, o condicionamento de jumentos para cobrir éguas é um campo aberto para estudos dos adeptos da etologia, e é provável que outras alternativas possam ser aplicadas ou já estejam sendo aplicadas e não sejam do conhecimento dos autores.


Outro dito frequente neste meio de criação é que, uma vez treinado para cobrir éguas, o jumento não poderia ser apresentado para fertilizar jumentas, com o grande risco de ele não voltar a cobrir éguas. Na experiência dos autores, isto não é uma verdade plena. Em algumas ocasiões, jumentos treinados para cobrir éguas foram utilizados na monta natural de jumentas sem perder o interesse posterior pelas éguas. Não se deseja aqui desacreditar a fala de certos criadores, mas sim ponderar que podem existir jumentos condicionados que se comportam de uma determinada maneira ou de outra. Interessante seria realizar uma avaliação mais criteriosa para determinar sob que condições alguns perdem o desejo de continuar cobrindo éguas, enquanto outros mantêm esta particularidade. Interessante também seria saber qual é a proporção de machos que perdem ou mantêm esta capacidade após voltar a interagir com uma fêmea da mesma espécie.


Na tentativa de analisar o que de fato acontece em monta natural a campo, um estudo foi direcionado para este fim (Lodi et al., 1995). Convém, antes de descrever os achados, relembrar a organização social dos asininos e dos equinos. Os primeiros, como citado anteriormente, têm uma organização do tipo territorial (Moehlman, 1998a, b; Moehlman et al., 1998),, ou seja, o macho reprodutor domina um certo território e cobriria as fêmeas em cio quando de sua passagem por esse território. Os equinos, por outro lado, se organizam em forma de harém, caracterizado pela permanência de um grupo relativamente estável de fêmeas adultas junto a um garanhão. Este grupo é predominantemente liderado por um garanhão, que alterna com a fêmea dominante algumas tarefas de defesa e manutenção do grupo estável. As crias, ao atingirem a puberdade, espontaneamente acabam se afastando do grupo (Klingel, 1975).


Feita esta consideração, é conveniente analisar o que de fato pretende-se ao desejar-se a produção de muares de forma extensiva. A intenção é colocar um jumento (territorial) para cobrir a campo éguas (organização em forma de harém), estas que nem para o macho de sua própria espécie demonstram um comportamento sexual tão participativo como aquele expresso pelas jumentas. Além disso, a égua deveria, atendendo ao comportamento normal dos asininos, responder a certos chamados do jumento, como aquele da vocalização. Deve ser esperado, antes de tudo, neste sistema de produção, um conflito de organização social. Portanto, além da necessidade de condicionamento do macho, as fêmeas (éguas) podem requerer um período de adaptação.


O resultado do estudo (Lodi et al., 1995; Henry et al., 1998) do comportamento de três jumentos cobrindo éguas a campo é relatado a seguir. Estes foram avaliados individualmente com um grupo de 20 éguas submetidas à indução de cio. Os três machos testados eram devidamente condicionados a cobrir éguas, com experiência prévia considerável, e as fêmeas tinham tido contato esporádico com jumentos.


Como era de se esperar, a participação das fêmeas no cortejo sexual foi muito incipiente, mesmo no terceiro período de observação quando as mesmas fêmeas foram utilizadas na avaliação do último jumento. Portanto, a responsabilidade da eficiência do sistema de cobrição ficou quase que exclusivamente restrita às ações do macho. Foi observado que o jumento, ao longo do dia, iniciava vários períodos de procura para a identificação de fêmeas em cio, expressando sequencialmente os mesmos comportamentos de cortejo descritos para a interação intraespécie. A duração dos períodos de cortejo foi, no entanto, menor do que o observado para a espécie asinina em cruzamento intraespécie. Em inúmeras ocasiões foi observado, mesmo para as éguas em cio e próximas da ovulação (controle feito pelo toque retal [ovulação] e rufiação [cio] com garanhão no início de cada noite), que elas rejeitavam até com certa intensidade o assédio do jumento. Devido ao fato de as tentativas serem em campo aberto permitindo o fácil deslocamento, várias foram as vezes em que a tentativa de cobrição resultou em insucesso. Considerando as condições experimentais, não se pode descartar que a falta de experiências prévias das éguas seja a principal razão do insucesso parcial. No entanto, a falta de evolução da receptividade delas ao macho quando em cio no período de teste do terceiro jumento é indicativo de que outra estratégia que não a experiência prévia por tempo limitado tem que ser utilizada para melhorar o grau de receptividade das éguas.


Para os três períodos de observação, a eficiência reprodutiva esteve muito aquém daquela usualmente obtida em cruzamentos intraespécie quer seja para asininos ou equinos. A fertilidade nas três avaliações esteve próxima aos 50% considerando-se aquelas fêmeas que de fato ovularam. Várias fêmeas em cio não foram cobertas, e algumas em pleno estado de receptividade nem foram detectadas neste estado pelos machos asininos. Por outro lado, em várias ocasiões, quando as fêmeas eram recolhidas no curral para separação do macho, estes, em curto espaço de tempo, acabavam cobrindo uma ou duas éguas, sugerindo que em área restrita a eficiência poderia ser outra. A baixa fertilidade não pode ser atribuída aos machos, pois os três tinham um quadro de qualidade e produção espermática considerado adequado.


Portanto, neste estudo em particular, pôde-se observar que o insucesso parcial foi mais resultante de uma incompatibilidade de comportamentos e de aceitação mútua do que outra provável causa. A intenção aqui não é de querer transmitir que resultados mais favoráveis não possam ser alcançados em sistema extensivo de produção de muares; o que se pretende é deixar a mensagem de que não é a simples mescla de um jumento com experiência em cobrir éguas com um grupo de éguas que resultará em boa eficiência reprodutiva, mesmo que tanto macho (jumento) como fêmeas (éguas) tenham boa capacidade reprodutiva. É evidente que cada componente deste sistema mantém o comportamento inerente à organização social de sua espécie e que o desejo de produzir muares a campo sem um planejamento e preparação prévios e um acompanhamento mais próximo pode lograr insucesso ou apenas sucesso parcial.
Em condições de normalidade, a fertilidade de jumentos é usualmente alta, quer seja em cruzamento intraespécie (jumentas) ou em interespécie (éguas). Nos cruzamentos intraespécie, a fertilidade geralmente é boa tanto em monta controlada como em monta a campo, e nos cruzamentos interespecie (jumento X égua) na monta controlada.


No cruzamento interespécie (garanhão X jumenta) para a produção de bardotos, o mesmo fato não é verdadeiro. Foi cientificamente comprovado que, quando a jumenta coberta por garanhões é fértil, ela manterá este potencial se não ocorrer qualquer anormalidade. Por outro lado, quando a jumenta não concebe após várias cobrições realizadas por garanhões, ela tem a grande tendência de continuadamente não ser fertilizada por garanhões, podendo ser plenamente fértil se coberta por jumentos. Esta incompatibilidade ao ser coberta por garanhão foi demonstrada ocorrer devido à incapacidade específica dos óvulos (zona pelúcida) dessas jumentas de proverem as condições necessárias para a entrada dos espermatozoides de garanhões (Allen et al., 1987). Portanto, a eficiência de produção de bardoto a campo encontraria mais uma barreira além daquelas de comportamento já ponderadas.


A disponibilidade atual de metodologia científica de avaliação de comportamento animal não invalida as ponderações feitas por criadores experientes que dedicaram sua vida ou suas horas de lazer à criação de muares e bardotos. A estas experiências de vida, bom seria associá-las a resultados de mais estudos com metodologia científica.

 

Fonte: M. Henry1, L.A. Lago, L.F. Mendonça

Rev. Bras. Reprod. Anim., Belo Horizonte, v.33, n.4, p.223-230, Oct./Dez. 2009.

Nenhum comentário:

Postar um comentário