Com frequencia, animais marchadores necessitam de algum tipo de ajuda mecânica para ser tornarem bons marchadores. Entretanto, esclareço que andamentos impostos não são geneticamente transmissíveis. Portanto, é imprescindivel que a marcha seja natural, o que implica em deslocamentos dissociados. O uso de ferraduras pode ser uma necessidade, em decorrencia da disponibilidade de terrenos duros e pedregosos para treinamento. Em outros casos, o uso de ferraduras tem a finalidade de corrigir defeitos na forma dos cascos, alterar a modalidade de andamento ou incrementar a performance.
Na maioria dos haras, o serviço de ferreiro é desempenhado pelo próprio peão, que nem sempre foi devidamente qualificado. Além do mais, ferrar um animal de marcha nem sempre é o mesmo que ferrar um animal de trote. Nos marchadores, pequenas alterações na angulação dos cascos ( especialmente dos cascos anteriores ) e no peso das ferraduras, podem resultar em efeitos drásticos, às vezes desfavoráveis. Um tipo de ferrageamento indicado para um animal pode não surtir o mesmo efeito em outro. O segredo é preservar o maximo da naturalidade, principalmente como forma de prevenir as afecções.
O ferrageamento é conduzido de acordo com a conformação de cada animal, no que diz respeito a forma dos cascos; eventual desbalanceamento e/ou desvio de aprumos; ângulo de inclinação das quartelas, ângulo de inclinação das espáduas; ângulo de inclinação das pernas e dos jarretes e eventuais deficiências na marcha.
Para marchadores, nas modalidades marcha batida e marcha de centro, a angulação média de cascos anteriores é na faixa de 55 graus, sendo mais favoraveis as variações abaixo, até 52 graus, tendo em vista que em direção ao extremo superior há tendência ao endurecimento da marcha, pelo efeito da maior obliquidade das quartelas, que atuam como amortecedores. Nos cascos posteriores, para estas mesmas modalidades de marcha, a angulação sobe para a faixa dos 60 graus, em média. Os cascos posteriores exercem a função principal de impulsionar, e não de apoiar, como é o caso dos cascos anteriores, que nos marchadores exercem ação extra na tração.
Para marchadores, na modalidade marcha picada com excesso de lateralidade, até o extremo da andadura desunida, os ângulos tendem a diminuirem, em torno de 50 a 52 graus nos anteriores e 55 graus nos posteriores, ou até menos, pois há uma prevalência de animais acurvilhados nestas modalidades de marcha.
Correções na forma dos cascos:
Os defeitos mais frequentes na forma dos cascos são os talões estreitos (contraídos), talões escorridos ( adiantados ), parede estreita (com mais frequencia na região do quartos), desbalanceamento médio lateral da pinça ou de todo o casco, casco encastelado ( talões excessivamente altos ), casco achinelado ( pinça excessivamente crescida ).
Correções dos desvios de aprumos:
Antigamente, o uso de meia ferradura para a correção de desvios de aprumos era pratica corriqueira. Apresenta a desvantagem de provocar desequilibrios na sustetanção e na locomoção, favorecendo o desenvolvimento de diversos tipos de afecções de membros. A técnica atual é o uso de ferraduras com parafusos nos talões. Gradativamente, aumenta-se a altura, alterando a regulagem de altura dos parafusos. São ferraduras indicadas para as correções de desvios mais acentuados, nos tipos joelhos cambaios e jarretes fechados, ambos prevalentes em raças de marchadores.
Correções no tipo de andamento:
A correção da andadura desunida ( a convencional é quase que impossivel ) pode ser através do uso de ferraduras pesadas nos cascos anteriores e leves nos cascos posteriores, ou até mesmo não usar ferraduras nos cascos posteriores. Os cascos anteriores também são ferrados com grande crescimento das estruturas ( para aumentar ainda mais o peso em relação aos cascos posteriores, que são devidamente aparados para o ferrageamento ). Outra alternativa é manter os talões mais altos nos cascos anteriores. Um terceiro artificio é o uso de correntes nas quartelas, com proteção de couro, para evitar ferimentos. Todavia, neste terceiro recurso os resultados são imprevisíveis, pois há risco de provocar elevação excessiva dos membros anteriores, com desequiblibrio. Esta seria uma última tentativa, após as duas primeiras terem falhado.
Muitos animais de andadura apresentam dificuldade para encartar e manter o galope, especialmente o galope reunido. O treinamento ao galope somente é iniciado após o sucesso na correção da andadura desunida. Raramente, o andamento ensinado será a marcha batida, mas sim uma marcha picada de melhor equilibrio entre apoios laterais e diagonais. De qualquer forma, ainda será uma marcha que proporciona melhor equilibrio de sustentação, relativamente à andadura desunida, o que favorece um pouco mais ao animal encartar o galope.
A correção de uma marcha excessivamente diagonalizada é o contrário. Nos cascos anteriores, recomenda-se o uso de ferraduras leves, com angulação mais alta nos talões e pinça mais curta. E nos cascos posteriores ferraduras pesadas, com pinça mais longa e ângulo menor nos talões. A tração pode ser aumentada nas subidas de morros, em estradas de piso preferencialmente regular. As descidas também favorecem a dissociação dos bipedes diagonais. Ao contrário, no caso da correção de andamentos excessivamente lateralizados, as descidas não são favoraveis. Para estas situações, o passo é o andamento melhor indicado.
Particularmente, adoto métodos naturais para correções de imperfeições em andamentos marchados. Caso estes métodos naturais não tenham sucesso, a ultima alternativa será o uso de ferraduras e/ou de correntes com proteção de couro, como forma de prevenir ferimentos.
Uma prática cruel ja foi registrada em muares de marcha trotada (cruzamento do jumento Pêga, marchador de triplices apoios, com égua da raça Mangalarga, de marcha trotada ). Alguns muladeiros aparam os cascos de membros anteriores até o limite da sola, provocando dor, que por sua vez faz com que o animal marcha apalpando dos cascos anteriores. O desequilibrio na sustentação tende a provocar a dissociação entre bípedes diagonais.
Ferraduras de alta performance:
As ferraduras de alta performance ainda não são rotineiramente utilizadas para animais de marcha no Brasil. As tradicionais são as ferraduras de pinça quadrada, que exercem a função básica de proporcionar mais retidão aos deslocamentos, o que se reveste de especial importância nos julgamentos de morfologia, na etapa da avaliação dos apumos. Também servem para melhorar o estilo da marcha, além de eventuais ganhos na regularidade e desenvolvimento. Outros tipos de ferraduras de alta performance são as frisadas, que favorecem a melhor aderência, o que pode ser vantajoso em pistas escorregadias. Os desenhos de frisos são variados.
Independente de qual seja o andamento desejável, ferreiros nunca devem esquecer os princípios que fundamentam esta técnica especializada que é o ferrageamento. Alguns destes princípios:
- As ferraduras devem estar em tamanho apropriado para os cascos, proporcionando suporte homogêneo ao redor dos quartos e talões;
- Não pode haver sobras de ferraduras. Estas são como a continuação dos cascos;
- Não se prepara o casco para a ferradura, mas sim o contrário;
- O ângulo do casco não deve variar mais do que três graus em relação ao ângulo natural, sob pena de provocar afecções. Nestes casos, o animal precisa se acostumar com a mudança de angulação, que traz estresse imediato sobre os tendões.
Qualquer artifício tende a representar solução temporária. A solução permanente é selecionar bons marchadores, de cascaria saudavel e bem conformada, bem aprumados, de forte constituição óssea-muscular, submetidos a um manejo profissionalmente conduzido.
Texto adaptado. Autor: Lúcio Sérgio de Andrade
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