Bem Vindo ao Blog do Pêga!

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Existe muita literatura sobre cavalos, mas poucos escrevem sobre jumentos e muares. Este é um espaço para postar artigos, informações e fotos sobre esses fantásticos animais. Estamos sempre a procura de novo material, ajude a transformar este blog na maior enciclopédia de jumentos e muares da história! Caso alguém queira colaborar com histórias, artigos, fotos, informações, etc ... entre em contato conosco: fazendasnoca@uol.com.br

quarta-feira, 2 de março de 2011

Variações de Marcha

 

Muito tem-se discutido sobre as variações da marcha. A polêmica se acirra quando estão em jogo as marchas batida e picada.

A lista de discussões acessada via internet tem sido palco de polêmicos debates sobre a marcha e suas variações, sendo também esta a razão da escolha deste tema pela ABCCMM, que sente-se no dever de se posicionar a respeito, levando a seus Associados uma referência mais concreta e objetiva de sua postura neste assunto.

A título de esclarecimento, os termos “marcha picada”  e “marcha batida” foram substituídos no vocabulário técnico da Associação por marcha lateralizada, marcha de centro e marcha diagonalizada. Enquanto aqueles termos sugeriam, cada um, um tipo específico de marcha, as novas expressões definem melhor o que ocorre quando variações se apresentam, de acordo com as alterações nos tempos de apoio laterais e diagonais, promovidos pelo animal.

Para melhor compreendermos estas possíveis variações, vamos definir corretamente a marcha:

Andamento marchado ( no qual o animal se mantém  em permanente contato com o solo ), simétrico, regular, a quatro tempos ( em um ciclo completo as batidas dos cascos no solo são distintas, gerando quatro sons também distintos ), com apoio alternado dos bípedes laterais e diagonais, sempre intercalados por momentos de tríplice apoio.

Na marcha clássica o animal deve promover oito apoios diferentes, conforme esquema abaixo:

TAD >  TRÍPLICE ANTERIOR DIREITO

DD  >  DIAGONAL DIREITO

TPE  >  TRÍPLICE POSTERIOR ESQUERDO

LE   >  LATERAL ESQUERDO

TAE  >  TRÍPLICE ANTERIOR ESQUERDO

DE  >  DIAGONAL ESQUERDO

TPD  >  TRÍPLICE POSTERIOR DIREITO

LD  >  LATERAL DIREITO

As variações na marcha clássica vão ocorrer de acordo com o tempo que o animal se mantém em cada uma destes oito apoios.

Até há pouco tempo, pensava-se que a marcha lateralizada tinha tempos de apoio laterais maiores que os diagonais. Por sua vez, a marcha diagonalizada tinha os tempos de apoio diagonais maiores que os laterais. Definiu-se como marcha de centro a marcha que apresentava tempos de apoio laterais e diagonais iguais.

Analisando detalhadamente filmes de animais em marcha, constatou-se que praticamente em todas as variações, os tempos de apoio diagonais são sempre maiores que os laterais. Interessa, neste caso, o quanto maior é o tempo de apoio diagonal sobre o lateral. Definiu-se então as variações da seguinte forma:

  1. marcha diagonalizada: ocorre quando os tempos de apoio diagonais são muito maiores que os laterais;
  2. marcha de centro: ocorre quando os tempos de apoio diagonais são maiores que os laterais;
  3. marcha lateralizada: ocorre quando os tempos de apoio diagonais são pouco maiores que os laterais.

Observou-se que quando os tempos de apoio laterais se igualam aos diagonais, o animal se encontra na transição entre a marcha e a andadura.

Definindo didaticamente estas variações, criou-se o seguinte diagrama:

ANDADURA <<L4<<L3<<L2<<L1<CENTRO>>D1>>D2>>D3>>D4>>TROTE

Entre a andadura e o trote se encontra a marcha com suas variações:  D1, D2, D3 e D4 são gradações de marcha diagonalizada, variando de D1, próximo à marcha de centro, a D4, marcha extremamente diagonalizada, próxima do trote; Do outro lado, L1, L2, L3 e L4 são gradações de marcha lateralizada, variando de L1, próximo à marcha de centro, a L4, marcha extremamente lateralizada, próxima da andadura. Os termos “marcha picada” e “marcha batida” não nos dão a dimensão destas possíveis variações da marcha.

A marcha clássica à qual nos referimos acima é exatamente a que apresenta as oito possibilidades de apoio descritas, na mesma seqüência do esquema. É possível ocorrer a supressão de um ou mais apoios no ciclo, ou mesmo sua substituição por um apoio monopedal. Quando isto ocorre, não se pode afirmar que o animal não está marchando, mas sim que a marcha não é de total qualidade, não é clássica. Ocorrendo algum momento de suspensão total, aí sim estará descaracterizado o andamento marchado. Da mesma forma o animal não estará marchando, se ocorrer apoio e avanço exclusivos de bípedes laterais, intercalados por apoios quadrupedais. Neste caso, o andamento caracteriza-se como andadura.

A marcha de centro reúne todos os pontos positivos de forma plena, incluindo a comodidade, o equilíbrio, o estilo. Especificamente é esta a variação da marcha que mais preenche o padrão, e portanto a que vem sendo valorizada nos concursos, tanto quanto no momento do registro. Ocorre, no entanto, que as variações de marcha lateralizada e marcha diagonalizada apresentam limites bem mais amplos que os da marcha de centro. Dificilmente encontramos animais precisamente de centro, pelos limites estreitos que definem esta variação.

Correndo o risco de ferir a ética, mas evitando citar nomes para minimizar este risco, gostaria de me reportar à Exposição Especializada de Caxambu, promovida pela ENA no inicio deste ano, quando da reciclagem dos árbitros. Naquela ocasião, num determinado concurso de marcha, tivemos a felicidade de nos deparar com um animal tipicamente de marcha de centro. Por todas as qualidades que apresentava, além de seu gesto genuíno, e realmente de centro, este animal não só obteve o título de campeão de marcha, como foi extremamente elogiado pelo árbitro em seu comentário. Foi unanime a opinião dos presentes, inclusive criadores defensores da marcha lateralizada, quanto às qualidades expressas por aquele animal, que foi inclusive montado por curiosos depois de sua premiação. Como integrante do trio responsável pelo julgamento naquela ocasião, sinto-me à vontade para tecer este comentário, confirmando que apesar de pouco comum, sempre que animais desta natureza se apresentarem em pista, sua classificação será superior. Não existe determinação em contrário.

Considerando a marcha picada, ou lateralizada, onde os tempos de apoio diagonais são apenaspouco maiores que os laterais, o ponto de equilíbrio do animal oscila consideravelmente, no sentido lateral, deslocando seu peso de um lado para o outro. Isto força o cavalo a compensar tais oscilações mobilizando de forma acentuada o pescoço, o que interfere negativamente no estilo de marcha. A estabilidade do tronco fica comprometida, tanto quanto o equilíbrio, pelas oscilações citadas. A necessidade de retomada constante de equilíbrio promove um desgaste físico acentuado no animal. Ao longo de uma prova de marcha, este desgaste é significativo, levando o animal a alterar seu gesto, interferindo negativamente na regularidade. Ainda que não oferecendo atritos verticais ao cavaleiro, esta variação da marcha promove um atrito lateral, que é percebido em cavalgadas longas. Além do atrito lateral, o desequilíbrio é fator de desconforto para o cavaleiro, pela insegurança gerada ao executar figuras, como também pela dificuldade do animal em fazer transições, como a partida ao galope, por exemplo. Ainda sobre a marcha lateralizada, é comum que os animais que apresentam esta variação sejam limitados quanto ao rendimento. Sabe-se que a propulsão nos eqüinos é promovida pelos membros posteriores. Passadas curtas com o posterior significam pouco rendimento, e esta característica acontece com freqüência também pelo deslocamento acentuado do ponto de equilíbrio, no sentido lateral. Para melhor compreendermos o que ocorre, façamos uma comparação do cavalo com um barco, no qual o canoeiro usa um remo, sentado na parte posterior do barco. Ao remar por exemplo, do lado esquerdo, o canoeiro promove um deslocamento do barco para a frente, além de direcionar a porção dianteira do barco para a direita:

Comparando o descrito acima com um cavalo, ocorrem duas situações diferentes, conforme seja mais diagonalizado ou lateralizado o animal. Vejamos:

Caso seja diagonalizado, ao promover a distensão do posterior esquerdo, por exemplo, o cavalo estará apoiado também em seu anterior direito, que irá canalizar a força de propulsão para a frente, impedindo um desvio do ponto de equilíbrio para a direita ( que ocorre com o exemplo do barco).

Caso seja o animal lateralizado, ao promover a distensão do posterior esquerdo, o anterior esquerdo estará também apoiado, enquanto o anterior direito se encontrará em suspensão. Desta forma, o ponto de equilíbrio do cavalo será deslocado para a frente e para a direita, como no barco.

Se o animal lançar mão de todo seu potencial para promover uma passada longa, seu ponto de equilíbrio irá deslocar tanto do eixo central, a ponto de não mais ser possível recuperar o equilíbrio. Este animal, certamente, cairá.

Desta forma, mesmo que tenha recurso suficiente para dar passadas longas, este animal deverá conter sua elasticidade, promovendo passadas curtas, consequentemente de pouco rendimento. Esta tese poderia ser rebatida ao se considerar o exemplo dos animais puxadores de “aranha”, que são pequenas charretes puxadas por animais de andamento totalmente lateralizados, numa prova de velocidade em que o animal lança mão do máximo de sua elasticidade para imprimir velocidade em seu deslocamento. Ocorre neste caso que a troca de apoio de um bípede lateral para o outro acontece por um momento de suspensão total. Neste caso, o centro de gravidade do animal é lançado para cima, durante a troca de apoios laterais, o que mantém seu equilíbrio mais estável, sem grandes oscilações laterais.

Para que sejam competitivos em relação aos animais de centro, ou mesmo aos de marcha um pouco diagonalizada ( D1 ), cavalos lateralizados precisam se mostrar superiores em todas as características naturais da marcha. Precisam ter temperamento de sela extraordinário, grande qualidade de impulsão, se superar no equilíbrio, para que possam dar passadas longas e executar figuras e transições com facilidade, ter qualidades extremas de proporções e angulações de membros, além de perfeitas regiões zootécnicas ligadas à dinâmica eqüina. Além disso, é indispensável que se apresentem plenamente adestrados, para que possam explorar e evidenciar todas estas qualidades. Tudo isto nos faz entender que é difícil se encontrar um animal lateralizado que preencha todos estes requisitos, a ponto de competir em igualdade de condições com animais de maior equilíbrio, e que por este motivo apresentam performance melhor pontuada. Quando, no entanto, eles se apresentam, com certeza são bem classificados.

Além do que foi posto até aqui, existe outro fator que normalmente leva os criadores a pensar em discriminação em relação à marcha picada. Os animais lateralizados, em esmagadora maioria, apresentam esta variação da marcha não por qualidades, mas sim por defeitos de conformação. Limitações de angulação e proporção de membros, problemas de aprumos, ou mesmo deficiências em regiões zootécnicas diretamente ligadas à dinâmica, levam quase sempre a esse tipo de andamento, desequilibrado, irregular, de pouca impulsão, baixo rendimento, enfim, de qualidade inferior. Nestes casos, o registro é também dificultado, já que somam-se limitações de conformação a outras de andamento. Deve-se lembrar, inclusive, que para ser registrado em definitivo, o animal deverá obter no mínimo 50 % da pontuação destinada ao andamento.

Se fizermos uma avaliação estatística, certamente iremos concluir que muito poucos são os animais lateralizados que obtiveram boas colocações em concursos de marcha ou mesmo o registro definitivo. No entanto, esta verdade não acontece por discriminação à marcha picada,nem mesmo por uma determinação da Associação a seu quadro de técnicos de registro ou de árbitros. Ocorre sim por problemas de conformação que apresentam a maioria de animais lateralizados, além da dificuldade de outros lateralizados em superar de forma compensatória as limitações criadas pelo desequilíbrio característico da dinâmica lateralizada.

Como autor deste texto, concluo dizendo que seu conteúdo expressa não somente meu ponto de vista como técnico, mas também a posição oficial da ABCCMM  em relação às críticas quanto a discriminação em relação à marcha picada, e que por esta razão também assina este artigo.

O conteúdo acima expressa a opinião do autor sobre o assunto. Caso você deseje complementar ou até mesmo discordar do tema sua opinião técnica também será publicada aqui.

Autor: Roberto Naves . Árbitro da ABCCMM Fonte: Empório do Criador

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