Bem Vindo ao Blog do Pêga!

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O propósito do Blog do Pêga é desenvolver e promover a raça, encorajando a sociedade entre os criadores e admiradores por meio de circulação de informações úteis.

Existe muita literatura sobre cavalos, mas poucos escrevem sobre jumentos e muares. Este é um espaço para postar artigos, informações e fotos sobre esses fantásticos animais. Estamos sempre a procura de novo material, ajude a transformar este blog na maior enciclopédia de jumentos e muares da história! Caso alguém queira colaborar com histórias, artigos, fotos, informações, etc ... entre em contato conosco: fazendasnoca@uol.com.br

quinta-feira, 24 de julho de 2014

A História do Tropeirismo

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Nos Séculos XVII e XIX, os tropeiros eram partes da vida da zona rural e das cidades pequenas dentro do Sul do Brasil, inclusive a nossa Itapeva e outras do Estado de São Paulo. Vestidos como gaúchos com chapéus, ponchos, e botas, os tropeiros conduziram rebanhos de muares e gado e levaram bens por onde passaram. De São Paulo, os animais e mercadorias foram para os estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais.


O Tropeirismo é associado com a procriação e venda de muares e gado, mas realmente começou com a descoberta de ouro em Minas Gerais. Ao término do Século XVII, com o crescimento de ouro que minava perto de Ouro Preto, muitas pessoas vieram àquela área e resolveram ficar. Com o aumento súbito da população uma necessidade veio para mais comida, como também para animais para transporte. Os habitantes de Minas Gerais tiveram que comprar tudo de outros locais, como o gado da Argentina e do Brasil Sulista. Enquanto em alguns estados do Brasil desenvolvia-se as minerações de ouro, indústria se plantações de cana de açúcar, desenvolvendo respectivamente no centro e nordeste, o sul estava criando cavalos, e gado. Também havia uma provisão grande de mulas que foram consideradas excelente para levar cargas por estradas antigas perigosas. Porém, a região sulista era longe das outras áreas do Brasil. Como estes rebanhos poderiam ser trazidos aos compradores previdentes? Os tropeiros eram a solução.

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A palavra tropeiro é derivado da palavra tropa.


Os tropeiros eram tropas de homens gado motriz por florestas densas que não foram povoadas pesadamente naquele momento. Para fazer a viagem deles por estes territórios vastos, eles usaram normalmente rios como guias naturais. Antes de 1730, os tropeiros estavam transportando o gado e muares à Feira de Sorocaba. Por causa dos tropeiros, muitas das áreas pelas quais eles passaram começaram a se desenvolver. Eles também contribuíram ao desenvolvimento de várias indústrias, e Cidades ao longo da rota e além do transporte e venda de gado e muares, faziam também o trabalho de correios como levar e trazer noticias de um lugar para outro. No Século XIX, quando o estrondo do ouro terminou, o tropeiros viraram a transportar produto dos cafezais que floresciam no Estado de São Paulo.

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Com o passar do tempo os caminhos abertos pelos tropeiros foram se constituindo em estradas e os lugares onde ajeitavam seus pousos foram formando vilarejos que se tornaram mais tarde em cidades. Acredita-se que os tropeiros existiram até o começo do Século XX, talvez até 1940.
Foram, portanto os grandes responsáveis pela fixação do homem ao campo e o Ciclo do Tropeirismo, talvez tenha sido um dos mais importantes à história e desenvolvimento do Brasil.

Fonte: Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapeva

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Jumento não é mais irmão

 

O Globo

A seca dos últimos dois anos agravou a situação de abandono dos jumentos no Nordeste. Companheiro do sertanejo no trabalho duro e ícone da resistência no semiárido, o jumento ficou, na expressão dos próprios nordestinos, “sem serventia”. De nada lhe adiantou o costume a longas jornadas, pouca água e comida escassa. Descartado no transporte de cargas, idosos e crianças, centenas deles estão sendo expulsas das fazendas, colocadas do lado de fora das cercas, ao deus-dará. Com fome e sem ter onde ficar, perambulam pelas estradas em busca de comida. Provocam acidentes graves. Morrem e causam mortes.

— A serventia dele agora é pouca. Aqui não tem mais roça, só pasto. E o jumento estraga o pasto, compete com o boi pela comida. O grandes (fazendeiros) não querem mais, e os pequenos não têm nem lugar onde pôr. Antes ele prestava para carregar carga, agora todo mundo tem seu carrinho. A gente fica com pena do bichinho, mas fazer o quê? — lamenta Luiz Gonzaga Borges Pereira, de 59 anos, dono de um armazém à beira da MA-122, no município de Buritirama, no Maranhão.

A situação dos jumentos no Nordeste se arrasta desde que as motocicletas se popularizaram, vendidas a prestações de R$ 60 até em lojas de móveis da região. A imagem da família que ia às compras na cidade e voltava levando as mercadorias e as crianças no lombo do jegue não existe mais. E ninguém faz questão de se lembrar da “Apologia ao jumento”, que conta a saga do maior amigo do sertão na voz de outro Luiz Gonzaga, o famoso: "Arrastou lenha... madeira... pedra, cal, cimento, tijolo... telha. Fez açude, estrada de rodagem, carregou água pra casa do homem... fez a feira e serviu de montaria. O jumento é nosso irmão...”

Hoje em dia, nem mesmo onde ainda se usam animais, o jumento encontra espaço. Na montaria nos pastos, a preferência sempre foi pelo cavalo, mais ágil e imponente. Para puxar a carroça, o tamanho adequado é o do burro. Fruto do cruzamento do jumento com a égua, o burro é tão forte quanto o pai, mas tem o porte da mãe.

— É tanto jumento abandonado que a gente não sabe o que fazer. É no Nordeste inteiro. E é muito difícil conseguir ajuda, porque a maioria das ONGs de animais cuida de cães e gatos — afirma Geuza Leitão, presidente da União Internacional Protetora dos Animais (Uipa) no Ceará.

No Ceará, 800 jumentos apreendidos por mês

Largado à própria sorte, o bichinho de olhar triste e desamparado virou estatística de trânsito. Segundo a Polícia Rodoviária Federal, o Nordeste registrou 1.783 acidentes com atropelamento de animais nas estradas em 2012. O estado com maior número de casos foi a Bahia, com 429 acidentes que resultaram na morte de 18 pessoas no ano passado. A Bahia é também o dono do maior rebanho de asininos do país — 254.277 cabeças, segundo dados do IBGE de 2011. Em Pernambuco, o atropelamento de animais na pista causou 16 mortes em 2012. No Piauí, foram 260 acidentes, com cinco mortes. Na maioria das vezes, o animal em questão é o jumento.

— Com outros animais, acontece menos. Perder uma vaca é perder carne, leite, manteiga. Cavalo é caro, tem custo — diz Pedro Paulo Bahia, assessor de comunicação da PRF em Brasília. O problema é tão grave que a Polícia Rodoviária Federal e os Detrans estaduais passaram a criar estruturas para recolher os jumentos nas rodovias. No Ceará, o Detran apreendeu 11 mil jumentos no ano passado. Este ano, a média tem sido de 800 por mês. Diariamente, 13 caminhões de resgate fazem a ronda nas estradas. Os animais apreendidos são levados para a Fazenda Paula Pessoa, no município de Santa Quitéria. O local já chegou a abrigar dez mil jumentos, mas tem hoje menos da metade. Muitos morreram ou precisaram ser sacrificados por contraírem doenças.

— Os animais sadios, como cavalo e burro, são doados para associações. Bois, vacas e carneiros vão para entidades beneficentes, para alimentação. Mas, o jumento, ninguém quer — lamenta João Carlos Macedo, responsável pelos regionais do Detran-CE. Raimundo Torquato, administrador da Fazenda Paula Pessoa, conta que muitos jumentos chegam machucados, com as pernas quebradas, sem casco ou até mesmo com orelhas e rabo cortados. Recebem tratamento veterinário, mas ali não há pasto abundante. Ao contrário, o lugar é de seca. Para ajudar a alimentá-los, a Uipa do Ceará conseguiu doação da ONG francesa One Voice e compra milho.

O apoio internacional só veio depois da divulgação de um acordo com a China, que queria comprar 300 mil animais por ano do Brasil para comercialização e industrialização da carne e derivados. O anúncio gerou protestos de entidades protetoras dos animais, e o acerto não vingou.

— Seria um extermínio — diz Macedo.

Segundo o IBGE, o Nordeste tem 877.288 jumentos, quase a totalidade (90%) dos representantes da espécie no país. Apenas Maranhão, Ceará e Piauí ainda têm mais de cem mil animais cada um.

Alexandre Cruz, chefe de policiamento e fiscalização da PRF no Piauí, diz que o órgão encaminhou a Brasília pedido para contratação de laçadores e equipes para recolher os animais que perambulam nas estradas por todo o Nordeste.

— Quando a gente recolhe vaca ou cavalo, o dono vai atrás. Quando é jumento, larga lá — conta Cruz.

Só no ano passado foram apreendidos 2.500 animais que vagavam pelas estradas federais que cortam o Piauí. A maioria jumentos. Não é raro que sejam novamente soltos dois ou três dias depois e voltem a vagar pelo asfalto. “O jumento é bom... O jumento é sagrado... o homem é mau”, dizia a música de Gonzagão.

Leia mais: http://extra.globo.com/noticias/brasil/jumento-nao-mais-irmao-8432314.html#ixzz2pvJQPN1G

terça-feira, 8 de julho de 2014

Fábulas - JUMENTO TEIMOSO

Este é um conto repetido de muitos modos. O Jumento costuma empacar e não seguir caminho por motivos que o Asneiro geralmente não entende. As mais das vezes, o Jumento estava certo! Nesta fábula o Asno deixa o terreno seguro e plano e se mete pelas ribanceiras. Seu dono tenta segurá-lo pelo rabo, pelo cabresto, pelas peças dos arreios e perde contra a força bruta do Jumento e tem que largá-lo para que despenque no abismo. Diz o Asneiro: “Essa vitória tu a tens, pois não disputarei cair junto contigo”. Dizem isso dos teimosos que não medem as conseqüências de seus atos. REVISÃO – Os portugueses são os reis das anedotas sobre Asnos, Asneiros e asnidades. O modo depreciativo luso de fazer essas piadas, entretanto, gosta de não ofender terceiros. Geralmente falam na primeira pessoa, ou atribuem o feito a outro português, um tramontano, um alentejano, um lisboeta, nascido na Bairrada, ou assumindo que foi o tio, o pai, o avô de quem conta. Uma dessas piadas, querendo insinuar que os Jumentos são mais inteligentes do que nós, conta assim: “O Jumentinho estacou à porta do estábulo, recusando entraire. Meu pai chegou e passou-lhe um braço ao peito e o outro atrás das ancas, ergueu-o do solo e levou-o para dentro, dizendo-lhe: Mais inteligente que eu tu podes seire, mas mais forte tu não és!” Pelo que entendemos de Esopo, a fábula procurava mostrar que onde não temos mais argumentos ou providências contra os erros dos outros, é prudente pelo menos não afundar juntamente com o teimoso. ATUALIDADE – Será que teremos a possibilidade de escapar da queda no abismo que está sendo programada a nível global pelas forças trevosas que se mostram como donos do ouro e das armas mortíferas? Se realmente os beligerantes possuem poder atômico para acabar com 30 vezes a população da Terra, podemos largar o rabo dos asnos dizendo-lhes que não vamos cair no precipício com eles?

Fonte: Shvoog

terça-feira, 1 de julho de 2014

A importância da mula na História

 

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Desde a antiguidade, muitos milhões de muares foram produzidos havendo vários relatos da importância econômica destes animais. Na Mesopotâmia e na Assíria, não ter um jumento para montar era um sinal de pobreza. Somente os mercadores muito ricos e oficiais militares podiam possuir mulas. Na Idade Média, enquanto os cavalos eram usados pelos cavaleiros nas batalhas, as mulas eram montadas pelos senhores feudais e clero.

Na História da exploração do novo mundo, embora os eqüinos tenham sido
fundamentais para a conquista da América Espanhola, chegando a serem considerados pelos nativos como Deuses, foram os muares que transportaram as riquezas para serem enviadas para a Corte da Espanha . Em 1495, Cristóvão Colombo trouxe quatro jumentos e duas jumentas para o novo mundo, tendo sido iniciado o primeiro criatório de muares na América. Dez anos depois da conquista dos Astecas, um carregamento de 20 jumentas e três jumentos chegaram no México provenientes de Cuba para se iniciar a criação de mulas com o intuito de transporte de cargas e de gente. As mulas eram as preferidas para serem montadas, enquanto os machos eram usados para carga. Estes animais eram usados nas minas de prata e cruzavam as trilhas que uniam o império Espanhol.

Ao longo da fronteira, cada posto avançado da coroa tinha que produzir suas
próprias mulas e cada fazenda ou missão tinha que manter ao menos um jumento reprodutor.

Como o Rio da Prata era o principal canal de escoamento destas riquezas, a região dos pampas se tornou um grande produtor de mulas ainda no século XVI. As Estâncias da região dos Pampas Argentinos se firmaram como grandes produtoras de muares para o Império Espanhol e posteriormente, a partir do séc. XVII para as minas de ouro do Brasil. O caminho dos tropeiros saía da Argentina, passava por Viamão RS. , chegando à Sorocaba SP, onde os animais eram comercializados para trabalharem nas minas de ouro e diamantes de Minas Gerais.

No Brasil, os muares foram muito importantes no transporte de mercadorias e riquezas, única opção para as regiões das Minas Gerais, onde faltavam estradas e sobravam locais pedregosos e íngremes.

Fonte: Mula Parida

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Tropeiro

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Tropeiro é a designação dada aos condutores de tropas, assim designadas as comitivas de muares, e cavalos entre as regiões de produção e os centros consumidores, a partir do século XVII no Brasil. Mais ao sul do Brasil, também são conhecidos como carreteiros, pelas carretas com as quais trabalhavam.

Cada comitiva era dividida em lotes de sete animais, cada um aos cuidados de um homem que os controlava através de gritos e assobios. Cada animal carregava cerca de 120 kg.e chegava a percorrer até 3.000km.

Num sentido mais amplo também designa o comerciante que comprava tropas de animais para revendê-las, e mesmo o "tropeiro de bestas" que usava os animais, para além de vendê-los, transportar outros gêneros para o comércio nas várias vilas e cidades pelas quais passava.

Além de seu importante papel na economia, o tropeiro teve importância cultural relevante como veiculador de ideias e notícias entre as aldeias e comunidades distantes entre sí, numa época em que não existiam estradas no Brasil.

Um dos marcos iniciais do tropeirismo foi quando a Coroa Portuguesa instalou em 1695 na Vila de Taubaté, a Casa de Fundição de Taubaté, também chamada de Oficina Real dos Quintos. A partir de então, todo o ouro extraído das Minas Gerais deveria ser levado a esta Vila e de lá seguia para o porto de Parati, de onde era encaminhado para o reino, via cidade do Rio de Janeiro.

Ao longo das rotas pelas quais se deslocavam, ajudaram a fazer brotar várias das atuais cidades do Brasil. As cidades de Taubaté, Sorocaba, Viamão, Santana de Parnaíba, Castro,Cruz Alta e São Vicente são algumas das pioneiras que se destacaram pela atividade de seus tropeiros.

Mesmo em 2011 tropeiros atuam em algumas regiões do Brasil, como os que transportam queijos e doces da região de ´Itamonte-MG para Visconde de Mauá-RJ.

Comércio

Antes das estradas de ferro, e muito antes dos caminhões, o comércio de mercadorias era feito por tropeiros, nas regiões onde não havia alternativas de navegação marítima ou fluvial para sua distribuição. As regiões interioranas, distantes do litoral, dependeram durante muito tempo desse meio de transporte por mulas. Desde fins do século XVII, as lavras mineiras, por exemplo, exigiram a formação de grupos de mercadores no comércio interiorano. Inicialmente chamados de homens do caminho, tratantes ou viandantes, os tropeiros passaram a ser fundamentais no comércio de escravos, alimentos e ferramentas dos mineiros. Longe de serem comerciantes especializados, os tropeiros compravam e vendiam de tudo um pouco: escravos, ferramentas, vestimentas etc. A existência do tropeirismo estava intimamente relacionada ao ir-e-vir pelos caminhos e estradas, com destaque para a Estrada real -- via pela qual o ouro mineiro chegou ao porto do Rio de Janeiro e seguiu para Portugal. O constante movimento, o ir-e-vir das tropas, não só viabilizou o comércio como também se tornou elemento chave na reprodução econômica do tropeirismo.

Os tropeiros transportavam uma grande variedade de mercadorias como açúcar mascavo, aguardente, vinagre, vinho, azeite, bacalhau, peixe seco, queijo, manteiga, biscoito, passas,noz, farinha, gengibre, sabão, fruta seca, chouriço, salame, tecido, alfaias, marmelada, coco, carne seca, algodão, sal, vidro para janela, etc.

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

terça-feira, 17 de junho de 2014

A Fábula do Jumento!‏

 

Um dia, o jumento de um fazendeiro caiu num poço...

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O animal relinchou penosamente por horas, enquanto o fazendeiro pensava o que fazer.


Por fim, o fazendeiro chegou à conclusão de que o poço precisava mesmo ser fechado e, como o animal estava velho, não valia a pena resgatá-lo.
O fazendeiro convidou seus vizinhos para ajudá-lo. Todos pegaram pás e começaram a jogar terra dentro do poço.


No início, percebendo o que acontecia, o jumento relinchava, desesperado. Depois, para surpresa geral, aquietou-se.


Algumas pás de terra depois, o fazendeiro resolveu olhar para baixo e ficou surpreso com o que viu.


O jumento sacudia cada pá de terra que caía sobre ele, e aproveitava a terra para subir um pouco mais.


Enquanto os vizinhos do fazendeiro continuavam a jogar terra no animal, ele a sacudia e subia cada vez mais.


Não demorou para todos se espantarem ao ver o jumento escapar do poço e sair trotando alegremente.

terça-feira, 3 de junho de 2014

Filhote raro de zebra com jumenta nasce na Itália após pulada de cerca

 

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Uma pulada de cerca, literalmente, resultou no nascimento de um raríssimo cruzamento entre uma zebra macho e uma jumenta, há duas semanas. O filhote incomum nasceu em uma reserva animal em Florença, na Itália, após a zebra Martin invadir a área onde estava a jumenta Jade. A notícia foi divulgada apenas esta semana e, degundo funcionários da reserva, Ippo, o filhote, passa bem. Ele puxou as listras do pai misturadas à cor predominante da mãe. Martin está na reserva desde que foi resgatado de um zoológico que ameaçava ir à falência. Jade se encontra no local por ser uma espécie rara de jumenta. Há 12 meses, a proprietária da reserva, Serena Aglietti, construiu a cerca que separava os dois animais, mas ela não foi o suficiente para impedir o nascimento do pequeno Ippo, o único filhote de zebra com jumento na Itália.


Leia mais: http://extra.globo.com/noticias/animais/filhote-raro-de-zebra-com-jumenta-nasce-na-italia-apos-pulada-de-cerca-9244676.html#ixzz2pvIsmJjw

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Vocabulário de Tropeirismo

Açoiteira – ponta de rédea com a qual o peão açoita o muar.

Alqueire – medida agrária (24.200 metros quadrados em São Paulo).

Apear – descer do animal.

Arção – peça arqueada do arreio.

Arreio – é como os peões designam, generalizando, o seridote, o lombinho, etc.

Badana ou Baldrana – manta de couro lavrado, que se coloca sobre o arreio, acima do pelego.

Bago – testículo.

Baio – pelagem do cavalo ou burro que se caracteriza pela cor amarela dos pêlos.

Barbela – cordel que prende o chapéu ao queixo.

Barbicacho – embocadura de correia de couro macio, que circunda os dentes incisivos inferiores num espaço chamado barra e a mandíbula dos cavalos e burros.

Berrante – espécie de buzina, feito com um ou mais chifres, acoplados, utilizado para “chamar” a boiada.

Bicheira - ferida dos animais.

Boi – quadrúpede ruminante, dotado de casco bi-partidos.

Braça – Antiga unidade de cumprimento equivalente a 2,2 m, muito utilizada pelos peões.

Bragado – animal com manchas brancas na barriga e nas pernas.

Bridão – embocadura para animais constando de duas peças de ferro articuladas, menos enérgico que freio.

Broca – doença dos cascos.

Bruaca – meia de couro cru, para transporte de utensílios de uma comitiva.

Buçal ou Buça – cabresto rústico e reforçado de couro cru, usado par doma de burros.

Burro – hibrido infértil resultante do acasalamento da égua com jumento.

Cabeçada – peça de couro dos arreios que se passa pela cabeça dos animais, completada pelo freio ou bridão e rédeas.

Cabresto – cabeçada de couro cru em correia ou torcido, ligado por aros metálicos, que se coloca na cabeça do burro ou cavalo, para conduzí-lo ou amarrá-lo.

Canecão – Cincerro maior do peitoral da mula que transporta a carga.

Cargueiro – burro ou mula com cangalha, um par de bruacas e utensílios.

Carona – manta de couro que se coloca sob o arreio.

Carro de boi – veículo de rodas, puxado por juntas de bois, destinado a transportar carga, distinguem-se as rodas, o eixo, a mesa e o cabeçalho.

Coador – saco de pano utilizado para coar café.

Comitiva – grupo de peões de boiadeiro, encarregados de transportar boiadas, é constituída de capataz, ponteiro, meeiros, chaveiros, culatreiro e o cozinheiro.

Couro ou Ligal – peça de couro cru que cobria a cangalha e sua carga.

Coxonilho – manta de tecido de algodão ou estopa guarnecida por retalhos de várias cores, que substitui o pelego.

Domador – peão amansador.

Embornal – saco duplo de pano com alça.

Enervar – esticar o couro com taquara.

Esteio – Escora de madeira.

Forno – construção de barro utilizado para cozer pão, assar carne, etc.

Freio – embocadura metálica recurvada.

Garrote – bovino jovem com idade de sete meses a dois anos.

Garrotilho – doença do burro, cavalo, semelhante a um resfriado.

Guaiaca – cinto largo de couro, dotado de bolsas para guardar dinheiro, relógio e uma espécie de coldre para arma.

Guampa – chifre trabalhado para servir de copo.

Guasca – tira de couro cru.

Guaxo – animal amamentado artificialmente com leite de outro animal que não da mãe.

Guieiro – que liga os bois na condição do carro.

Ilhapa ou Lapa – parte mais grossa do laço, também conhecida por afogador, cuja extremidade prende-se à argola.

Inteiro – burro ou cavalo que não foi castrado.

Jacá – cesto sem tampa, tecido através do cruzamento de tiras duplas de taquara.

Laço – corda trançada normalmente com quatro tentos (tiras de couro) e compreende quatro partes: - argola, ilhapa, corpo de laço e a presilha. Seu comprimento varia entre dez ou doze braças.

Látego – Correia de couro cru, que prende a barrigueira.

Lombilho – arreio próprio para doma.

Loro – correia dupla que sustenta o estribo.

Machinho – é um tufo de pêlos existente na parte posterior dos membros do cavalo, entre a canela e a quartela, cobrindo uma excrescência córnea (esporão).

Madrinha – égua ou mula que serve de guia de uma tropa de muares.

Maneador – correia de couro cru, com quatro centímetros de largura e oito braças de comprimento.

Maneia – correia utilizada para pear cavalos.

Mangueira – curral de gado.

Matungo – cavalo velho, manso.

Mula – fêmea do burro.

Pacuera – barrigada.

Palanque – moirão de madeira fincado no chão ao qual se prende o animal pelo cabresto.

Parelheiro – cavalo de corrida.

Pealar – laçar o animal pelos membros.

Peão – condutor de boiadas, amansador de burros.

Pelego – pele de carneiro curtida que se coloca sobre o arreio.

Pele de rato – pelagem cinzenta dos muares, com a crina, a cauda e as extremidades pretas e uma lista preta sobre a coluna vertebral (lista de burro).

Pisadura – ferimento no lombo dos animais.

Petiço – cavalo pequeno.

Picaço – cavalo preto com a cara (frente aberta) e os pés brancos.

Ponteiro – peão que segue à frente da boiada, tocando o berrante.

Redomão – burro recém domado.

Relho ou reio – chicote de trança comprida que termina em tala.

Retranca – correia de couro que cincunda o traseiro do animal de carga.

Serigote – espécie de lombinho.

Sino – cincerrro.

Sola – couro bem curtido.

Trote – andar saltado do cavalo, no qual os membros se movimentam por bípedes diagonais, havendo um momento de suspensão sem nenhum contato com o solo.

Xucro – animal bravio.

Zaino – pelagem castanha escura mais ou menos tapada dos cavalos.

Fonte: Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapeva

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Recém-criado, 'parque dos jumentos' abriga 100 animais no Sertão de PE

 

Espaço em Petrolina reúne animais retirados de estradas da região. Objetivo é evitar acidentes; jumentos podem ser adotados.

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Recém-criado com o objetivo de evitar acidentes no Sertão de Pernambuco, o Parque Ecológico, conhecido em Petrolina como "parque dos jumentos", já reúne cem animais recolhidos na beira de estradas da região.

O local, inaugurado há menos de um mês, tem capacidade para 400. O Instituto Qualivida é o responsável pela administração do espaço, que tem contado com parcerias com a Agência de Defesa Agropecuária de Pernambuco (Adagro), a Polícia Rodoviária Federal e prefeituras da região.

O projeto foi desenvolvido pelo deputado estadual Odacy Amorim. Acidentes como o ocorrido em janeiro motivaram a implantação. No início do ano, a dupla sertaneja Lusmar do Amaral e Linder foi desfeita após uma tragédia na estrada que corta o município de Santa Cruz. Um dos irmãos, Francisco de Alencar Amaral, de 34 anos, o Linder, bateu a moto em um jumento que trafegava na pista e morreu, provocando o fim forçado da parceria de mais de 15 anos.

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Para o idealizador do parque, é preciso agora que a PRF intensifique a circulação nas estradas para capturar os bichos. “Se não houver um trabalho ativo de todos, o espaço não vai adiantar”, afirma Amorim.

O inspetor-chefe da PRF em Petrolina, Paulo Lima, diz que a corporação não tem estrutura para fazer este tipo de trabalho sozinha. "Quando a prefeitura cede o vaqueiro, a gente oferece o carro com o motorista. Não há efetivo para uma ação exclusiva. A PRF também tem outras obrigações”, afirma.

Adoção
A adoção de animais, que podem servir como meio de transporte, é uma das opções do projeto. Além dos jumentos, também são recolhidos cavalos e burros abandonados próximos às estradas. "A gente está conseguindo sensibilizar as pessoas para a adoção, principalmente do jumento. Doze animais que tinham chegado ao parque já foram adotados", diz Amorim. Para adotar, é preciso que o candidato assine um termo de compromisso. "Se cada pessoa adotar um bicho desses, não será difícil resolvermos essa situação."

Todos os equinos encaminhados para o Parque Ecológico são submetidos a exames feitos pela Adagro na tentativa de identificar alguma doença que comprometa a saúde do animal. Mais de 60 dos animais já passaram pelo teste.

Além do parque, o Projeto de Conservação, Restauração e Manutenção de Rodovias realizado pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes também deve contribuir para a ausência dos animais nas estradas. Trechos de rodovias receberão cercas em breve. "Serão cercados 50 km, saindo do perímetro urbano de Petrolina até o Trevo do Ibó (bifurcação que divide os estados de Pernambuco e Bahia nas cidades pernambucanas de Cabrobó e Floresta)", afirma o analista do Dnit Anderson Nunes.

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sábado, 19 de abril de 2014

Tropa

 

As tropas seguiam para Pelotas, onde existiam as grandes charqueadas em grande número, cerca de quarenta; havia também algumas sobre o rio Jacuí.

Naquela cidade os produtos bovinos tinham mais facilidade de sair barra a fora em iates, por isso ela tornou-se o empório da indústria do charque, como já era o entreposto comercial do sul da Província.

Todas as tropas que se encaminhavam para lá iam diretamente para a Tablada, um descampado, espécie de mercado onde os charqueadores faziam suas compras. Vindos de distâncias longínquas, com 20 a 30 dias de viagem, conforme as zonas, elas se compunham de 600 a 1.000 bois; assim numerosos tinham a vantagem de diminuir as despesas por cabeça.

Para uma viagem tão longa se tornava necessário ser muito gorda a tropa; o aparte era livre e o tropeiro tirava bois de calção, ou próximo a isso.
Só alcançavam essa gordura excessiva animais de cinco anos acima.

Conhecidos esses pontos essenciais, vamos ver como se fazia uma tropa, depois acompanharemos sua marcha até a antiga Charcópolis, hoje Princesa do Sul e capital da sociabilidade rio-grandense, nos seus característicos atributos.

Era um serviço trabalhoso fazer uma tropa naquele tempo em que não havia invernadas e os gados não tinham grande costeio e muitos ainda se conservavam semi-selvagens.

Para retirar a novilhada gorda daqueles campos, tornava-se necessário parar todos os rodeios e isso demandava alguns dias de serviço ativo.

A boiada apartada no primeiro dia dormia na mangueira e no dia seguinte ficava em pastoreio, enquanto se paravam outros rodeios, cujos bois vinham para serem incorporados ao núcleo já formado.

No último rodeio tirava-se também mais de meia dúzia de munícios, novilhas gordas de dois anos que serviam para a peonada churrasquear na viagem; cada dois dias matavam uma. Vinha para a encerra a tropa feita desses animais bisonhos, assustadiços, alvorotados. Fechados naquele ambiente sem o horizonte habitual, ficavam aterrados.

A menor coisa assustava-os muito, à noite um cachorro que de repente pulava na cerca, um berro de um boi corneado por outro, ou a tosse de um outro, era bastante para a novilhada dar um arranco dentro da encerra.

Alta noite se ouvia aquele rumor do gado correndo na mangueira, era um arranco sem motivo às vezes. No outro dia pela manhã, ao sair da encerra, a novilhada estava delgada, brava e arisca, ao passar a porteira saía ligeiro, priscando com movimentos rápidos.

Era preciso domá-la, isto é, metê-la em volta.

Antes de começar a caminhar já se achavam na sua frente os melhores campeiros, pois o lugar de ponteiro é o de mais responsabilidade na marcha da tropa. Alguns campeiros procura vam amansá-la com um assobio monótono ao andar e com "venha, venha".

Ao principiar a caminhar, ela troteava, o capataz que já esperava por isso quebrava a ponta da direita para a esquerda, rebolando o relho obrigava todo o gado a redemoinhar; se ao seguir troteava novamente e se o lugar se prestava, dava outra volta na ponta fazendo girar ainda e com um assobio particular aquele bicharedo andava rápido nesse corrupio. Os que ficavam no centro eram tão apertados que levantavam muito a cabeça e então os chifres se batiam uns contra os outros com um rumor surdo.

Era um espetáculo bonito e chocante ver essas feras com suas armas alevantadas como se digladiassem em torneio louco.

Os da beirada troteavam acompanhando o movimento, nesse exercício precursor do domínio, a peonada abria os cavalos e deixava-os à vontade. Então, pouco a pouco, iam se alargando e sossegando. Se ao marchar troteavam outra vez, metiam em volta novamente e recomeçava a mesma cena.

Depois de repetidas vezes fazerem isso ao som de assobio adequado, os animais por si mesmo redemoinhavam.

A tropa braba com essas manobras aprendia a obedecer e ia se entregando, se amansando.

Habituados àquele movimento com o assobio, ela estando na mangueira bastava assobiar para ela entrar em giro e assim diminuía o arranco.

Para fazer-se uma idéia do que era um gado selvagem, cito um fato.
Foi posto na encerra um gado do mato; na véspera de uma enxurrada d'água, juntou muito lodo do lado de baixo, a ponto de entupir os buracos de ladrões, ficando um atoleiro mole.

No outro dia, existiam muitos animais mortos em cima do barro, outros quebrados e agonizantes. Tal foi o terror desses selvagens que, assustados, atiraram-se por cima dos outros e fizeram essa hecatombe.

Uma tropa braba nas condições descritas era natural que nos primeiros dias de marcha para Pelotas fizesse disparadas.

Bois criados à lei da natureza, de repente reunidos, ficavam bisonhos, assustadiços.

A noite, numa ronda, ou mesmo de dia debaixo de uma chuvarada, um trovão repentino, um relâmpago inesperado, o aparecimento rápido de um cachorro, o latido, ou por qualquer outro motivo se dava o estouro da boiada, como dizem no Norte.

O arranco de uma tropa de dia, em campo aberto, tornava-se relativamente fácil dominar se dois ou três campeiros bem destorcidos e bem montados corriam na dianteira para sujeitar a ponta. Mas se a disparada da tropa se dava durante uma noite escura, era difícil agir de modo útil na ocasião. Nestas condições se um cavaleiro rodava na ponta da tropa, só tinha um recurso para salvar-se, era dar tiros para o ar a fim de evitar que essa avalanche o pisoteasse passando por cima.

A conseqüência disso era a demora de dois ou mais dias para procurar ou recrutar o que faltasse na contagem; quase sempre havia prejuízos.

Passar a noite rondando um gado bravio, pronto a dar uma arrancada por qualquer motivo era um pedaço bem aborrecido e fatigante na condução de uma tropa, mas os homens afeitos àquele serviço rude não estranhavam; podiam passar a noite caminhando ou troteando ao redor dela quando estava desinquieta ou arisca.

Escolhido o lugar para a ronda, deixava-se o gado serenar e pastar à vontade.

Se a tropa era mansa e o terreno enxuto, pouco a pouco os novilhas iam se deitando e tudo corria bem; era uma noite bem passada. Mas se era braba, mal domada e ainda arisca, nos primeiros dias os cuidados se dobravam.

Ao entrar do sol, enquanto ela pastava sossegada, os peães iam se substituindo ao redor do fogão para comer e tomar mate, até que escurecia, então dividiam-se em dois grupos, um que fazia o quarto até meia noite e o outro turno cuidava dessa hora em diante.

Quem ia repousar maneava o cavalo, tirava os pelegos para uma cama ligeira, arrumava um travesseiro de fortuna, um pau, um tição, uma pedra, coberto com pelego e, com o cavalo pela rédea, dormia um sono bom, até que chegasse a hora de ser chamado para fazer o seu quarto, tomar conta da ronda. Essa providência de ficar com o cavalo encilhado tornava-se necessária para um auxílio pronto no caso de um arranco da tropa.

Enquanto o fogo estava aceso, a disparada se dava ao rumo do fogão em noite escura, diziam.

Nos primeiros tempos [em] que se faziam as tropas, as pastagens eram abundantes e livres; se no caminho existia uma encerra, pedia-se emprestada por uma noite.

Deste modo as tropas conduzidas com cuidado e bom tempo chegavam ao seu destino sem mermar no peso e gordura. Nestes caminhos para Pelotas, depois de uns tempos para cá os pastos já eram pagos, isto mesmo nas zonas mais trilhadas e ainda de certo ponto em diante. Alguns moradores à beira da estrada construíam encerras apropriadas para tropas e que alugavam para uma noite, quase todas feitas de taipas, altas e bem seguras. O tropeiro fazendo seu gado passar ali as horas de repouso, dava aos seus peães uma noite de descanso. Ao lado da porteira faziam o fogão, onde os pedaços sangrentos de um munício recém carneado tornavam-se apetitosos e gordos churrascos; depois do chimarrão e da palestra animada, vinha o sono reparador.

Se as circunstâncias tornavam-se favoráveis, podia aparecer algum vizinho morador para chalrear e se vinha uma viola, algum bardo gaúcha tomava-a e desferia suas cordas com cantares como os seguintes:

Triste vida a do tropeiro,
Que nem pode namorar,
De dia reponta o gado,
De noite toca a rondar.

Tenho um cavalo escuro
De andar de madrugada;
Marcha, marcha, meu cavalo,
Vamos ver a namorada.

Eu vi Cupido montado
No seu cavalo picaço,
De bolas e tirador,
De faca, rebenque e laço.

Eu mandei fazer um laço
Do couro de jacutinga
Para laçar um boi barroso,
Lá no passo da restinga.

Zomba o fado em ser cruel
Contra a minha triste sorte;
As penas que me acompanham
Terão fim só com a morte.

Quando eu era pequenino
Cantava que retinia...
Eu cantava em Caçapava
No Oriente se ouvia.

Dos filhos que meu pai teve,
Eu fui o mais destemido;
Para amar moça bonita
Eu fui o mais presumido.

Entre trevo nasce trevo,
Entre trevo nasce flor;
Sem ser trevo, eu me atrevo
A tomar contigo amor.

Quebrar ferro, romper bronze
Não acho valentia;
Valente é meu coração
Em sofrer tua tirania.

Se eu pudesse em teus braços
Libertar esta paixão...
Só assim sossegaria
O meu ardente coração.

Depois de um peito querer
E de um coração se agradar,
Não há mais poder no mundo
Que faça um bem se apartar.

Menina case comigo
Que trabalhador eu sou;
Com sol não vou à roça
Com chuva também não vou.

Eu vi meu bem por acaso,
Eu vi meu bem no jardim,
Com mangas arregaçadas
Seus braços cor de carmim.

Eu vi meu bem, não me engano
Que vi meu bem na janela,
Com mangas arregaçadas
Seus braços cor de canela.

Eu vi meu bem cozinhando,
Eu vi meu bem no fogão,
Com mangas arregaçadas
Seus braços cor de carvão.

Não há rosa na roseira,
Que não dê o seu botão,
Não há negra, na cozinha
Que não dê sua razão.

Estes e outros de espírito namorado, romântico, irônico, humorístico etc. pertencem à poesia popular rio-grandense.

De madrugada ligeira refeição e novos mates, depois aprontações, acomodar os fiambres, a chocolateira e os avios do chiinarrão, para recomeçar a marcha.

A novilhada, ao sair à porteira, às vezes era contada de novo para verificar se o número estava certo. Quando acontecia serem duas tropas candidatas à mesma encerra, naturalmente cabia de direito ao primeiro que chegava, a fala.

O dono algumas vezes apreciava a carreira entre dois tropeiros que pretendiam a mesma comodidade para seu gado.

De uma feita, um, em vez de correr, parou o cavalo e deu um tiro para o ar. Ao seu competidor foi respondido que a pólvora tinha falado primeiro.

Espírito de gaúcho.

A um tropeiro e à sua gente podiam acontecer coisas bem desagradáveis; eram as chuvaradas intermináveis. Uma tropa que se fazia ou terminava com tempo arruinado, dava motivo a aborrecimentos. Podia ser o começo de uma temporada de chuva que acompanharia a sua marcha até Pelotas com garoas contínuas ou chuvisqueiros repetidos.

Embora fosse verão, ou mesmo começo do outono e eles habituados às intempéries, tornava-se deveras enfastiante para os pobres peães de tropa.

Nessas condições, como fazer fogo para churrasquear? Como dormir? Arreios molhados, ponchos que não enxugavam, roupas úmidas. Se a noite era de ronda, alguns tinham de esperar seu quarto de serviço, dormindo sentados nos pelegos com os cavalos pelas rédeas.

Por sorte, com os aguaceiros repetidos, o gado também ficava abichornado e sossegado virando as costas para o lado da chuva e do vento.

Contavam os peães de tropa que no fim da jornada as roupas estavam imprestáveis, os xergões inutilizados e a cavalhada, composta de 3 a 4 cavalos de cada peão, ficava estranzilhada.

Porém o maior infortúnio era do tropeiro que via decair o seu gado e a sua tropa desvalorizar-se.

As temporadas de secas também davam motivos para ficarem aborrecidos, com as marchas forçadas a que eram obrigados para alcançar aguadas e pastagens convenientes. Os animais da tropa ficam desinquietos e nada os embrabece tanto como a sede. A maior seca na segunda metade do século passado foi a de 1875.

Durante a sua fase aguda apareceu na estância um tropeiro que precisava levar uma tropa para Pelotas. Diante da situação penosa que corria, tornava-se impossível parar rodeio para um serviço regular de apartes.

O recurso foi o das volteadas para pegar novilhos gordos. Daí muitos incidentes.

Um rapaz novato laça um boi nas proximidades da sanga da Guajuvira, o cavalo roda, o boi dá o tirão e volta enfurecido contra ele, mete a aspa no sangradouro e mata-o.

Resultado: um cadáver fica segurando firme um novilho bravio.

O mocito, com o susto, já tinha desaparecido, correndo sanga abaixo. Os campeiros o atenderam.

A mesma sanga, aliás bem forte, com ligações, estava logo abaixo reduzida a pequenos poços, onde todos os animais dos campos vinham desalterar-se da implacável sede; o veado e o sor ro aí deixavam suas catingas, o avestruz e o quero-quero algumas penas. Passava muito do meio-dia quando a tropa já crescida entrou nos maiores poços e demorou-se a beber e a pisotear. Nesse momento de um pequeno descanso, todos sequiosos procuravam desalterar-se; alguns seguiam pela sanga abaixo à cata de melhores poços.

Puro engano.

Um pouco de fiambre oferecido de um farnel tornou-me mais imperiosa a necessidade de beber o precioso líquido, mas só havia água pisoteada, barrenta e preta, porém... a sede estava mais preta!...

Que fazer?

Era uma ilusão tomar essa água através um lenço limpo, mesmo mastigando a carne para não sentir-lhe o gosto.

Parece que naquele tempo os raios ultravioleta do sol cumpriam bem a sua missão, ninguém adoeceu.

Mas voltemos ao assunto para lembrar que, hoje, fazer uma tropa torna-se muito simples: reunir na invernada a boiada já costeada, apartar o que está gordo; contar, faturar e receber o cheque é um trabalho de poucas horas.

Se ela foi vendida a peso, o dono vai ou manda assistir à pesada na charqueada e lá recebe o cheque.

Além disso, os apartes são mais favoráveis, não é preciso que um boi esteja bem gordo, tendo passado pela fase da carne branca há mais de mês, já serve; entretanto levam sempre a flor do gado.

Os estabelecimentos que beneficiam os produtos da indústria pastoril, saladeiros e frigoríficos, vieram colocar-se perto da matéria-prima e assim em poucos dias uma tropa lá está inteira em peso e gordura, no outro dia é a matança.

Raramente os gados para esses estabelecimentos são conduzidos em trem especial, pois o pesado frete encarece muito seu valor.

Quantas vantagens sobre o que se fazia! ...

Outrora lidava-se com bois bravios, sujeitos a disparadas e a prejuízos com viagens de 20 a 30 dias, conforme a procedência, despesas maiores, muitas vezes estropiavam-se na estrada áspera como grosa, da Serra das Asperezas; chegavam a Pelotas entranzilhadas e com grande quebra no peso e na gordura, mesmo desfalcadas de alguns, pois eram obrigados a deixar ou a vender no caminho reses que não podiam andar de tão estropiadas.

Também existiam dificuldades quanto ao transporte de dinheiros. O tropeiro que vinha a uma estância atrás de gado carregava um cinto forte de couro curtido de capivara ou veado, uma espécie de bolsa tubular, cheia de onças de ouro, regulava cada uma 32.000 réis; para verificação do peso deles havia umas balanças diminutas que dobradas carregavam no bolso.

Do câmbio não se cogitava, quase sempre andava no par. Em geral era um camarada de confiança que apresilhava na cintura, semelhante cinto pesado que castigava as cadeiras. Quando a quantidade era demasiado grande acomodavam em saquinhos bem resistentes dentro de peçuelos pequenos, redondos, muito fortes, trazidos pelo peão ao lado do patrão.

Também existia o dinheiro em papel que era preferível às vezes ao ouro depreciado pelas subidas do câmbio acima do par; arrumavam em cinto largo com pequenos bolsos abotoados, a que chamavam guaiaca.

Autor: Roberto Cohen, Página do Gaúcho

sábado, 12 de abril de 2014

Fábulas - O ABUTRE E O JUMENTO

 

Em outra versão do desprezo invejoso, conta Esopo que um Jumento estava estirado na estrada, fazendo-se de morto. Um Abutre mergulhou do espaço e aproximou-se do "grande banquete" em perspectiva. Mal dá a primeira bicada e o Jumento se levanta pronto para dar-lhe um coice. O Abutre afasta-se correndo. Ante o gargalhar de uma Hiena que também estava se aproximando, o rapinante exclama: "Não aprecio esse tipo de carne... Esse não está suficientemente gordo!" A Hiena teria retrucado: "Ou suficientemente morto?" Mais um que repita o conto, possivelmente lhe acrescente mais um ponto; que tal o Abutre treplicar, como fazem nossos Abutres políticos? É lógico! O Abutre ainda pode revidar, já que a Hiena só come o que está estragado, poderia acrescentar: "Ou suficientemente podre..."

Fonte: Shvoong

sexta-feira, 28 de março de 2014

TIPOS DE PELAGEM

 

As pelagens básicas se constituem em: Alazão, Baio, Branco, Cebruno, Colorado, Douradilho, Gateado, Mouro, Oveiro, Picaço, Preto, Rosilho, Tobiano, Tordilho e Zaino.


Pelagens Compostas:
Alazão chamalotado ou apatacado: Quando tem manchas mais claras e arredondadas.
Alazão dourado: O típico com reflexos do ouro.
Alazão típico: O que tem a cor da brasa ou da cereja.
Alazão ruano: Quando tem a cauda e crina claras.
Branco albino, melado ou rosado: Quando há uma despigmentação congênita, inteira ou parcial, das pestanas e da íris. Sua pelagem tem reflexos rosados. É sensível ao sol.
Baio branco ou claro: É uma tonalidade de creme desmaiado.
Branco mosqueado: O que leva pelo corpo, em forma irregular, pontos pretos do tamanho de uma mosca.
Branco porcelana: O que tem manchas pretas, as quais, por transparência, por meio dos pêlos brancos, produzem reflexos azuis da porcelana.
Baio achamalotado ou apatacado: Quando apresenta manchas redondas e mais claras do que o resto do corpo.
Baio amarelo: É como uma gema de ovo, quando estendida numa porcelana branca.
Baio encerado: Quando tem a cor mais escura, parecendo-se com a cera virgem.
Baio cabos negros: Quando tem as extremidades dos membros, da cauda e a crina escuras.
Baio cebruno: Também escura, levando no corpo manchas mais escuras do que o baio encerado. Baio dourado: quando tem reflexos do ouro.
Baio ovo de pato: Quando tem uma cor amarelado creme. Sua crina, cauda e cascos também são cremes. Baio ruano: é um baio com a cauda e crina claras.
Colorado típico: É avermellhado com o tom claro.
Colorado pinhão: Tem a cor do pinhão.
Cebruno ou barroso: Com a tonalidade mais escura do que a do baio cebruno, parecendo-se com a cor do elefante.
Douradilho: É um colorado desmaiado com reflexus dourados.
Douradilho pangaré: É o que tem o focinho, axilas e ventre mais claros.
Gateado típico: É um baio escuro acebrunado nas quatro patas e com uma linha escura, que vai da cernelha à garupa, com aproximadamente dois dedos de largura.
Gateado osco ou pardo: É mais escuro que o típico, assemelhando-se ao gato pardo.
Gateado pangaré: O que tem o focinho, as axilas e o ventre com a pelagem mais clara.
Gateado ruivo: O que tem a cauda e a crina aproximada a cor do fogo.
Lobuno claro: Quando se parece com a plumagem de uma pomba.
Lobuno escuro: Quando mais escuro do que o lobuno claro.
Zaino claro: Da cor da castanha.
Zaino negro: Como a castanha mais escura.
Preto típico: Tem a tonalidade semelhante ao carvão.
Preto azeviche: Preto vivo com reflexos brilhantres.
Tordilho claro: Quando tem predominância de pelos brancos.
Tordilho negro: Predomina os pelos pretos. Com a idade vai se tornando claro.
Tordilho chamalotado ou apacatado: Quando com manchas arredondadas mais claras.
Mouro negro: Se parece com o tordilho negro, com tonalidade azulada.
Mouro claro: É um gris azulado. Oveiro azulego: É um mouro claro com manchas brancas.
Oveiro bragado: Quando em qualquer pelagem portam manchas isoladas no baixo ventre.
Oveiro chita: É overo com manchas brancas salpicadas num fundo rosilho.
Oveiro de índio: Qualquer pelagem com manchas de tamanho médio.
Oveiro chita: É overo com manchas brancas salpicadas num fundo rosilho.
Rosilho abaiado: Quando tem pelos amarelados entre o vermelho e o branco.
Rosilho claro ou prateado: Quando predominam os pelos brancos sobre os vermelhos.
Rosilho colorado: Quando predominam os pelos vermelhos sobre os brancos.
Rosilho gateado: É um gateado com pelos brancos.
Rosilho mouro: É uma mescla entre pelos vermelhos, brancos e pretos.
Rosilho overo: Quando dentro da pelagem rosilha tem manchas brancas.
Rosilho tostado: Quando tem pelos tostados em lugar dos vermelhos.
Tobiano baio: É um baio nas mesmas condições dos demais tobianos.
Tobiano colorado: É um colorado nas mesmas condições do tobiano negro.
Tobiano negro: É um preto com manchas brancas grandes divididas com o preto.
Tobiano gateado: É um gateado nas mesmas condições dos demais.
Zaino claro: Da cor da castanha. Zaino negro: Como a castanha mais escura.
Também existem tobianos cebruno, alazão, douradilho, zaino, tordilho, etc.

Outros detalhes de pelagem
Entrepelado: O que tem uma mescla de pelagens diferentes, formando assim um total indefinido.
Pangaré: Quando descolorido em algumas regiões do corpo, sobretudo nas partes inferiores, destacando-se nas axilias, focinho e ventre, seu descolorido se assemelha a cana da Índia.
Rabicano: Quando nas caudas escuras tem pelos brancos na sua base.

Fonte: O Cavalo Crioulo

sexta-feira, 21 de março de 2014

Depoimento - Zezão

 

Fui achar o Zezão na periferia de Jussara, noroeste de Goiânia. Eu tinha entrevistado o Laudicione no dia anterior e este se prontificara a me levar na casa daquele que seria um dos mais velhos comissários de boiada que eu encontrei (além de seu Alcides e Zé da Neta). Zezão é de 7 de julho de 1926 e está com 81 anos completos. Conversamos durante boa parte da manhã de sábado, nublada e fresca, um contraponto ao dia anterior, quente e abafado. Zezão se animou com a entrevista, nos recebeu muito bem e se mostrou perspicaz e brincalhão. Mostrou-me muitas fotos antigas e contou um pouco de sua história para o Fotomemoria:

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- Zezão, diz aí o seu nome, onde nasceu, eu vou anotando aqui ...
- Meu nome é José Alves Rodrigues e eu nasci em Quirinópolis (sudoeste de Goiás) em 1926.
- Ficou por lá quanto tempo ?
- Morei lá até os 14 anos ... depois mudei pra Jataí (sudoeste de Goiás) e comecei a viajar com Tonicão Borges – o sr. conhece ele ?
- Não, não conheço, mas já ouvi falar dele lá em Jataí.
- Pois é, eu trabalhei uns 10 anos com ele, fazia viagem pra São Paulo e Mato Grosso ... naquela época não tinha estrada, era só no cerrado a viagem ...
- E as boiadas já eram grandes, uns 1000 bois ?
- É, tinha até de 1200, 1300 bois.
- Quanto tempo levava pelo cerrado, até São Paulo ?
- 40 marchas.
- E o trajeto, era qual ?
- A gente ia de Jataí pra Cassilândia, depois pra Aparecida do Taboado (ambas no atual MS), ali atravessava de balsa pra São Paulo, o dono da balsa era o Semi Rodrigues ... aí a gente ia beirando o rio até Andradina (rio Paraná), em São Paulo. Fiquei 10 anos assim ...
- E depois desse tempo ?
- Ah, eu casei pela segunda vez em 1953 e ...
- Já tinha então casado mais cedo ?
- É, meu primeiro casamento foi em 1941 em Quirinópolis ...
- Aí você casou de novo em 1953 ...
- Casei e fui trabalhar numa fazenda em Jataí, onde fiquei mais 7 anos. Em 1962 vim para Inhumas (cidade próxima e ao norte de Goiânia).
- Então você ficou muito tempo afastado da estrada, né ? E por que veio para Inhumas ?
- Eu fiz uma arte em Jataí ... aí tive que sair de lá ...
(Pausa)
- E você pode falar que arte foi essa ?
- Não, não posso falar não.

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- Em Inhumas, então, recomeçou a viajar ?
- Não, eu fui trabalhar em fazenda, com o Zé Palmeira. Aí mudei pra Presidente Prudente (SP) em 1968, fui morar lá pra trabalhar pro mesmo Zé Palmeira. Eu recebia o gado que ia de Goiás pra lá e levava para outras fazendas, na região de São Paulo mesmo. Fiquei lá até 72, quando voltei pra Goiás, em Inhumas de novo. Aí que eu fui viajar de comissário. Comprei minha comitiva e comecei a viajar ... morava em Inhumas, pegava gado no interior de Goiás e levava pro Pará, para São Paulo.
- E quanto tempo você ficou morando em Inhumas e viajando com sua comitiva ?
- Em 75 eu mudei pro Pará ... fui mexer com fazenda. Fiquei até 82. Quando voltei pra Inhumas comprei outra comitiva, outra tropa e recomecei ... e lembro que a primeira viagem dessa época foi pra Paulo de Farias, junto de Riolandia ...
- Zezão, qual foi a maior viagem que você já fez ?
- Foi pro Pará, não lembro em que ano ... mas foram 142 dias de viagem ... eu levava 10 peões ...
- 142 dias é muita coisa ! E 10 peões para que ?
- Porque era boiada grande, e além dos premereiros tinha os segundeiros, antes dos chaveeiros ...
- É, boiada muito grande, no estirão precisa de mais gente nos flancos mesmo ... E quando você veio morar em Jussara ?
- Em 96. Aí fiquei viajando até 2005. Parei, aposentei.

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- Em todos esses anos, houve alguma viagem muito boa, especial ?
- Todas as viagens eram boas ...Essa do Pará ... essa do Alfredo Gibran que eu levei 1723 bois, entreguei 1722. Só lá no Taboado (MS) que um boi quebrou a perna. Foram 106 marchas ... nunca vi um trem bom daquele jeito.
- Lá pro Pará ?!
- Não, foi lá pro Alfredo Gibran, em São Paulo.
- Foram 1723 bois ! Levava cortada (dividida em grupos) ou levava inteira ?
- Durante o dia eu levava ela cortada.
- E aí tinha duas comitivas, como é que fazia ?
- Não, era uma só. Soltava uma (parte) na frente, ela comia o dia inteiro, ia pro curral de corda ... depois soltava uns 700, passava na guia dela, ia comendo ... era tudo aberto, né ? Só dormia junto no curral.
- E ia engordando na viagem, né ?
- (ignora a pergunta) Seu Gibran ficou tão admirado que ele até me deu uma mula de presente ... já morreu.
- E viagem ruim ?
- Um dia dei um tiro num caboclo, ele estava numa camionete, depois disso a polícia me chamou, fui na mula até a delegacia, expliquei tudinho e a delegada me liberou. Era uma camionete cheia de gente, ele me ofendeu, a camionete saiu e eu atirei e acertei justo nele ...
- Viajava armado ?
- Eu só viajava armado. Naquele tempo podia, né ?
- Zezão, você é do tempo do burro cargueiro, quando não tinha carroça nas comitivas ...
- Eu viajei com cargueiro até 82, depois só carroça. Mas eu prefiro viajar de cargueiro ...
Zezão tem 4 filhos. Uma delas, Ana Rosa, sempre que podia, ia até onde o pai estava e viajava alguns dias na comitiva, montada em lombo de burro. Hoje aposentado, Zezão mantém o bom humor e cuida de uma chácara próxima ao bairro em vive, na periferia de Jussara.
Jussara,GO, outubro de 2007.

Fonte: Foto Memória

quarta-feira, 12 de março de 2014

Tropas Xucras

 

Todos os componentes da equipe que tangia a tropa chamavam-se tropeiros, mas é claro que entre eles havia uma divisão de funções. Via de regra, a tropa era comandada pelo próprio dono, auxiliados por um ou mais capatazes, conforme o número de animais.

Havia os peões ou camaradas, o madrinheiro, o batedor, o contador e o cozinheiro. O batedor ia na frente, verificando o caminho e o estado dos passos. Levava as guias para apresentar nos registros e organizava a passagem das tropas pelos povoados. O contador tinha a função de contar e recontar a tropa quantas vezes fosse necessário para garantir que não se desgarrara nenhum animal. O madrinheiro, que às vezes desempenhava as funções de cozinheiro, era geralmente um rapazote. Sua função era conduzir a égua-madrinha.

Esta levava um cincerro ao pescoço e servia de guia para as mulas. É que o muar, sendo cria de burro com égua, tende a seguir a fêmea eqüina, formando uma fila. Depois de acostumado, seguirá qualquer animal que tenha um cincerro, mesmo que seja outro muar. Entre os vários momentos difíceis de uma tropeada, havia três em especial: a passagem de rios que não davam vau, as tempestades e as arribadas.

Nas passagens de rios, as roupas e os mantimentos passavam em uma canoa (quando havia canoeiro no local, senão era preciso improvisar), as mulas e os tropeiros passavam a nado. Durante as tempestades, os tropeiros não podiam dormir, pois os animais se punham nervosos, havendo o risco de dispersarem-se. As arribadas ocorriam quando mulas desgarravam-se da tropa. Entre os tropeiros mais experientes era escolhido o arribador que tinha a função de voltar, achar os animais extraviados e alcançar a tropa. Era uma questão de honra, sendo motivo de muita vergonha o fracasso.

Uma tropa andava acerca de vinte e quatro a trinta quilômetros por dia. Saía-se antes do nascer do sol, após tomar chimarrão ou um café preto. Ao meio-dia, pausa para almoço, sesta para os tropeiros e descanso para os animais. A segunda etapa da marcha ia até a tardinha.

O pouso era sempre em lugares certos, onde, com o tempo, foram se estabelecendo comerciantes para atender aos tropeims. Nesses locais, o comerciante ou fazendeiro construía um rústico galpão aberto, com cobertura de palha, para abrigar os tropeiros que dormiam sobre os arreios, cobertos com o poncho ou a capa. O cozinheiro montava sua trempe e cozinhava o feijão com charque ou carne de porco salgada para comerem no dia seguinte.

A passagem pela cidade de Lages era muito esperada porque ali melhorava o cardápio. Um dos pratos típicos da região é, até hoje, a paçoca de pinhão que consiste, basicamente, em charque cozido e desfiado com pinhão cozido e socado em um pilão (pode ser feito também com carne de porco salgada). Com as bruacas carregadas de paçoca, os tropeiros seguem viagem. A vantagem desse alimento era que. além de durar vários dias sem estragar, podia ser comido até mesmo em movimento, quando a fome apertasse.

Os trajes dos tropeiros foram variando com o tempo e dependiam um pouco de sua origem, mas, basicamente, era o chapéu de abas muito largas, com barbicacho sob o queixo; calças folgadas e camisas de algodão grosso; guaiaca de vários forros para levar muito dinheiro, além dos avios de fogo, fumo e palha; botas de cano muito alto, sanfonadas, da cor natural do couro, com tentos para amarrar na altura da coxa; poncho ou capa de baeta; um facão sorocabano e uma garrucha. Os tropeiros castelhanos e rio-grandenses usavam chapéus de abas menores e chiripás. Depois da Guerra do Paraguai, generalizou-se a bombacha.

Autor: Roberto Cohen, Página do Gaúcho

quinta-feira, 6 de março de 2014

Vacina contra “ferida da moda” em cavalos

 

A Pitiose é uma doença que atingem humanos e animais, principalmente cavalos, conhecida popularmente como “Ferida da moda” ou “Ferida braba”.

É provocada por um fungo encontrado principalmente em locais alagadiços, ambiente propício ao desenvolvimento da doença característica de climas tropicais e subtropicais. Registros da doença no mundo apontam o Pantanal brasileiro como o lócus de maior incidência da enfermidade em todo o planeta, podendo atingir até dez por cento da tropa equina. As características físicas pantaneiras são ideais a proliferação do fungo, mas seus prejuízos são significativos na agropecuária em todo o país.

As medicações antifúngicas utilizadas no tratamento da doença são ineficazes no combate ao agente etiológico Pythium insidiosum, responsável pela Pitiose, que provoca na maioria dos casos mortes e invalidez dos animais.

Em pesquisa, a Embrapa Pantanal em parceria com a UFSM, desenvolveu uma medicação, conhecida popularmente como “vacina”, chamada Pitium Vac, de custo estimado de desenvolvimento da droga de, aproximadamente, cem mil reais.

De acordo com pesquisadores, o tratamento desenvolvido é menos oneroso aos produtores, com economia, comparando a outros tratamentos, de até quinhentos reais.

Não existe ainda exportação do produto, mas países que possuem um número de casos significativos da doença, como Colômbia, Argentina, Guatemala, Haiti, Estados Unidos, Nova Zelândia, Tailândia, Índia, dentre outros, poderão receber a vacina.

Fonte: Empraba Pantanal

Adaptação: Escola do Cavalo

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Como um simples tropeiro …

 

A montaria usada por D. Pedro nem de longe lembrava o fogoso alazão que, meio século mais tarde, o pintor Pedro Américo colocaria no quadro "Independência ou Morte", também chamado de "O Gritodo Ipiranga", a mais conhecida cena do acontecimento. O coronel Marcondes se refere ao animal como uma "baia gateada". Outra testemunha, o padre mineiro Belchior Pinheiro de Oliveira, cita uma "bela besta baia". Em outras palavras, uma mula sem nenhum charme, porém forte e confiável. Era esta a forma correta e segura de subir a Serra do Mar naquela época de caminhos íngremes, enlameados e esburacados.

Foi, portanto, como um simples tropeiro, coberto pela lama e a poeira do caminho, às voltas com as dificuldades naturais do corpo e de seu tempo, que D. Pedro proclamou a Independência do Brasil. A cena real é bucólica e prosaica, mais brasileira e menos épica do que a retratada no quadro de Pedro Américo. E, ainda assim, importantíssima. Ela marca o início da história do Brasil como nação independente.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Tropeiros: Uma saga de 250 anos

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Dia 26 de abril é o Dia do Tropeiro no Estado de Santa Catarina. Foi a data da morte, em 1733, do padre Cristóbal de Mendonza e Orelhana, primeiro tropeiro brasileiro vindo do pampa argentino, em 1732, com destino no Rio Grande do Sul, chegando em Santa Catarina no ano seguinte.


Durante 250 anos os tropeiros foram responsáveis por toda a comercialização e transportes de produtos e informações no Brasil. Uma justa homenagem.
A palavra "tropeiro" deriva de tropa, numa referência ao conjunto de homens que transportavam gado e mercadoria no Brasil colônia. O termo tem sido usado para designar principalmente o transporte de gado da região do Rio Grande do Sul até os mercados de Minas Gerais, posteriormente São Paulo e Rio de Janeiro, porém há quem use o termo em momentos anteriores davida colonial, como no "ciclo do açúcar" entre os séculos XVI e XVII, quando várias regiões do interior nordestino se dedicaram a criação de animais para comercialização com os senhores de engenho.


Ao longo do tempo os principais pousos se transformaram em povoações e vilas. É interessante notar que dezenas de cidades do interior na região sul do Brasil e mesmo em São Paulo, atribuem sua origem a atividade dos tropeiros.


O comércio de animais foi fator determinante para integrar efetivamente o sul ao restante do Brasil, apesar das diferenças culturais entre as regiões da colônia, os interesses mercantis foram responsáveis por essa fusão e indiretamente, pela prosperidade tanto da grande propriedade estancieira dos estados do sul, como de pequenas propriedades familiares, em regiões onde predominaram populações de origem européia e que abasteciam de alimentos as fazendas pecuaristas.


Uma vida de tropeiro
Eles viajavam grandes distâncias, durante semanas seguidas, conduzindo gigantescas tropas de gado. Os veículos não eram caminhões-boiadeiros, mas pequenas mulas, que cumpriam com valentia o trabalho. A saudade de casa, a falta de notícias da família, o sofrimento físico no caminho. Tudo fez parte da vida dos tropeiros, homens que se arriscavam para impulsionar o desenvolvimento do Brasil.


Em Santa Catarina, as homenagens a estes heróis viraram a lei de número 13.890, do ano passado, que estabelece o dia 26 de abril, no caso, hoje, como o Dia do Tropeirismo.


Vivendo atualmente na localidade de Monte Alegre, em São Joaquim, na Serra Catarinense, Vidal Cândido da Silva Neto, 78 anos, é um dos homenageados. O mais velho entre 10 irmãos, ele concluiu o antigo ginasial na escola e voltou para a fazenda, onde vivia com a família. Em 1953, sua mãe morreu, a situação ficou difícil, e ele, com 25 anos, precisou ajudar ainda mais.


Os irmãos saíram para estudar, e Vidal continuou no campo. Foi quando virou tropeiro. As primeiras viagens foram longas. Com mais cinco cavaleiros, comprava gado na região de Cruz Alta (RS) e levava até São Joaquim.


Numa destas lidas, conduziu 512 cabeças. A dificuldade era maior quando os animais paravam para beber água nos riachos ou, então, quando se perdiam, e Vidal e seus companheiros eram obrigados a procurá-los na mata.


Vidal não lembra detalhes da viagem mais longa. Diz apenas que saiu de São Joaquim com 30 touros e foi até Guarapuava (PR), de onde voltou, após bons negócios, com 260 bois.


Ele recorda da tensão na descida da Serra do Rio do Rastro, quando muitos animais rolavam montanha abaixo. Alguns eram resgatados; outros, jamais encontrados. O joaquinense guarda uma passagem por Vacaria (RS), quando uma grande nevasca surpreendeu a tropa, e, isolado, dormiu sobre a montaria da mula.


Às vezes faltava comida. A chuva, o vento e o frio eram companhia da maioria das viagens. No entanto, Vidal nunca pensou em desistir e, hoje, orgulha-se do que fez até os 60 anos.


Ficou a saudade das viagens, da receptividade dos moradores e, principalmente, dos amigos - todos falecidos, mas que conservam, em suas famílias, a história de uma nação.


Hoje, vive em sua fazenda, a Fazenda Ipê, onde recebe hóspedes em sua pousada. www.fazendaipe.com

Fonte: Overmundo

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

OS MUARES E AS MINAS: RELAÇÕES ENTRE A DEMANDA MINEIRA E O MERCADO DE ANIMAIS DE CARGA NOS SÉCULOS XVIII E XIX

 

Resumo: O objetivo deste artigo é atualizar o debate em torno da inserção dos animais de carga criados no extremo sul do Brasil dentro do mercado interno mineiro ao longo dos séculos XVIII e XIX. Para  tanto, trabalhamos com conjuntos documentais inéditos relacionados ao período imperial, elaborados  por diversas unidades fiscais paulistas e mineiras encarregadas da fiscalização dos fluxos de animais de carga, em especial o registro
do Rio Negro, a barreira de Itapetininga e as recebedorias da fronteira entre as províncias de Minas Gerais e São Paulo. Inicialmente,  apresentamos uma revisão dos avanços historiográficos mais recentes sobre o tema no que se refere ao período colonial, procurando estabelecer o processo de consolidação deste sistema de abastecimento. Em seguida, apresentamos as novas evidências compiladas sobre o período imperial, colocando-as em
perspectiva com outras evidências quantitativas disponíveis e também com estudos complementares que discutem as transformações da economia mineira durante o século XIX. Buscamos assim, simultaneamente, fornecer contribuições originais ao debate e criar um quadro de referência para seu futuro desenvolvimento.

Palavras-chave: mercado interno; animais de carga; documentação de registros.


I – INTRODUÇÃO: ECONOMIA MINEIRA E TRANSPORTE DE CARGA

As atividades pecuárias desenvolvidas no extremo sul do Brasil desde o século XVII estiveram relacionadas aos impulsos de demanda oriundos da região das Minas Gerais por laços, se não estreitos e unívocos, certamente duradouros. Tais ligações estão associadas fundamentalmente ao fornecimento de animais de carga, dos quais dependia a economia da
região centro-sul para seu bom funcionamento. Estes animais eram criados em condições altamente favoráveis nas planícies do sul, geograficamente adequadas para a pecuária e já estruturadas em torno desta  atividade quando do primeiro surto de demanda das Minas Gerais. Ao longo dos períodos colonial e imperial, modificaram-se as formas de inserção da
demanda mineira no mercado de animais  de carga, acompanhando a própria dinâmica evolutiva da economia brasileira. Não obstante, o quinhão mineiro nunca deixou de constituir parcela relevante da totalidade deste mercado.


Minas Gerais demandou animais de carga desde princípios do século XVIII, sendo responsável pela manutenção da atividade pecuária nos campos do sul do Brasil após o declínio da mineração de prata na minas de Potosí, na América espanhola – até então o principal mercado consumidor das bestas de carga produzidas na região do Prata. Há marcante coincidência cronológica entre a intensificação da remessa de animais sulinos rumo às regiões centrais da colônia e os registros dos primeiros afluxos regulares de animais do sul em território mineiro. A intensificação no fluxo de animais está relacionada à abertura do chamado Caminho do Viamão, ligando o interior da capitania de São Pedro do Rio Grande à região dos Campos Gerais, no território do atual estado do Paraná.

A partir de então, teve início a condução regular de tropas de animais pela nova estrada, que ligava os centros produtores  do sul à região central, onde os animais eram demandados. É também na década de 1730 que Sérgio Buarque de Holanda identifica um crescimento neste fluxo de animais. Segundo o autor, é a partir de 1733, ou pouco depois, que começa a avolumar-se o numero de bestas muares vindas do sul, geralmente de
passagem para as Minas. E acrescenta:

Em 1754, segundo documento constante do livro de registro de cartas-régias, provisões, procurações, etc. da vila de Parnaíba, cujo teor me foi comunicado por um dos melhores conhecedores da história sul-paulista, o cônego Luiz Castanho de Almeida, um tropeiro castelhano, Bartolomeo Chevar, conduziu dos campos rio-grandenses para as Minas Gerais 3.870 cabeças de muares.

A demanda por animais de carga em Minas Gerais advinha então principalmente do setor mercantil, envolvido na distribuição das importações. Conforme ressalta Celso Furtado (2001, pp. 76-77), a economia da mineração, ao contrário das culturas litorâneas, caracterizava-se por uma dependência funcional extrema em relação aos sistemas de transporte e comercialização, necessitando,  para seu bom funcionamento, de um fluxo constante e regular de abastecimento de animais de carga.

Com o declínio da atividade mineradora  no Brasil, a região das Minas foi sendo progressivamente deslocada como principal centro consumidor dos animais de carga do sul. Os primeiros postos em importância relativa passaram a ser ocupados pelos novos centros dinâmicos da economia da região centro-sul, primeiramente a cultura canavieira e posteriormente a cultura cafeeira. Entretanto,  apesar de perder importância relativa, a
demanda mineira por animais de carga sobreviveu ao fim do período  colonial e subsistiu durante todo o período imperial. Estes animais eram então utilizados na circulação interna de mercadorias dentro da província de Minas Gerais – cujo contingente demográfico consolidado durante o ciclo aurífero constituía dilatado mercado interno – e também no intercâmbio de mercadorias entre esta província e as vizinhas. Nestas bases prosseguiria a
demanda por animais de carga até quase o fim do período imperial, quando a penetração da malha ferroviária em território mineiro  lhe imporia novo deslocamento, restringindo a prática do transporte no lombo de animais a trajetos de pequena e média extensão em locais afastados.


Além de sua fundamental importância na viabilização das atividades econômicas da região centro-sul e em seu abastecimento interno, o comércio de animais de carga também teve marcante relevância fiscal durante os séculos XVIII e XIX. Além de uma série de taxas de menor vulto, os animais de carga eram gravados por dois tributos de valor bastante
elevado, os direitos sobre animais e a taxa sobre bestas novas. Os direitos sobre animais incidiam sobre animais soltos vindos do sul com destino à região central e seu valor, no caso dos muares, era de 3$500, sendo que 1$000 cabiam à província de São Pedro do Rio Grande e 2$500 à província de São Paulo. O valor da taxa sobre bestas novas era ainda maior, os cofres da província de Minas Gerais arrecadando 5$000 por cada muar solto a ingressar em seu território. Este tributo constituía parcela substancial da receita das províncias, atingindo aproximadamente 12% do total da receita de São Paulo no ano financeiro de 1860-61 e 9% da de Minas Gerais no decênio 1850-59, à guisa de ilustração.

A arrecadação daí advinda deve ter sido de suma importância para as finanças provinciais, a julgar pelos esforços despendidos na tentativa de evitar o descaminho das tropas, conforme se observa na seguinte comunicação entre a Presidência das Províncias de São Paulo e Minas, datada de 1846:

acusando a recepção de ofício de 30 de Março deste ano, em que V.E., pelos motivos de economia pública nele expostos, exigia que esta Província [São Paulo] transmitisse a essa Presidência [de Minas Gerais] relação nominal dos indivíduos que no Registro da Cidade de Sorocaba pagassem o imposto de 500 réis sobre cada besta nova que por ali passasse, com declaração do numero delas. (APM, PP 1/36, Cx.20, Doc.48)

O objetivo do presente artigo é esboçar um panorama da evolução das relações entre a demanda mineira por animais de carga  do sul e o comportamento deste mercado de animais como um todo. Para tanto, compilaremos evidências quantitativas apresentadas até o momento pela historiografia sobre o assunto e as colocaremos lado a lado com novas
informações desveladas a partir da pesquisa com a documentação dos registros, barreiras e coletorias das províncias de São Paulo e Minas Gerais que de várias formas registraram os fluxos destes animais. Visando uma melhor clareza na exposição, dividiremos o restante do trabalho em duas seções, tratando do mercado de animais de carga nos períodos colonial e
imperial, respectivamente. Na primeira destas seções, ofereceremos um sumário dos avanços registrados até o momento pela historiografia do período, para então, na seção subseqüente, inserir as contribuições oriundas de nossa  pesquisa primária com a documentação das unidades fiscais dentro de uma análise mais abrangente do mercado de animais durante o
período imperial.

 

II – O PERÍODO COLONIAL: CONSOLIDAÇÃO DO MERCADO

A primeira grande onda de emigração ao planalto central do Brasil pressionou forte demanda por meios de transporte – inicialmente, cavalos. Até meados do século XVIII a demanda por animais de transporte pessoal e de carga supria-se de rebanhos de cavalos já existentes na área do rio São Francisco. A contínua expansão dos pólos auríferos na primeira metade do século XVIII fez incrementar as linhas de abastecimento, tornando a condução de animais do distante sul do país, desde cedo, negócio lucrativo. A ampla utilização de cavalos para o transporte pessoal adiou a pressão de demanda por bestas muares (mulas), cruzamento do gado eqüino com o asinino(burros), mais compactas, fortes e resistentes, melhor adaptadas ao terreno montanhoso.

Os animais de carga constituíam demanda direta do setor mercantil envolvido na distribuição das importações. Desta forma, deve haver relação direta entre a demanda por bestas muares e o trânsito de entradas de mercadorias nos registros. Em 1716/17, os registros mineiros anotaram 11.612 cargas de secos e de molhados importadas, 83,3% via estrada velha de São Paulo (registro da Mantiqueira), as quais exigiriam cerca de 4.000 viagens de mula. Mais comumente feito em lombo de cavalos, o transporte exigiria mais viagens. Gastavam os paulistas dois meses “desde a  vila de São Paulo até as Minas Gerais dos Cataguás” em 1703, ou seja, pelo menos 1.500 animais estavam envolvidos no comércio de importação. Em 1718 aportaram em Portugal 8.926 kg de ouro, os quais poderiam ser conduzidos aos portos do Brasil em apenas 100 viagens de mulas.

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A intensificação da demanda por animais de carga do sul do país se dá em meados do século XVIII, justamente quando a produção de ouro começa a estagnar. Acompanha, grosso modo, o incremento das importações. A produção de ouro e as remessas do metal para Portugal atingem seus máximos no período 1730-50, ápice  circa 1735-39. O rendimento dos direitos de entrada das importações, por sua vez, tem movimento ascendente, firme e contínuo, a partir de 1729, ápice em 1755-56, mantendo-se próximo a esse nível até meados da década de 1760 ou 70. Virgílio Noya Pinto nota que, embora se verifique semelhança da flutuação da produção de ouro às rendas da Coroa em Minas (quintos, dízimos e passagens), tal não ocorre no caso das entradas, as quais dependem diretamente do transporte por animais.

Compreensível é esta divergência, pois as entradas, refletindo as importações da capitania, apresentam uma defasagem com relação às demais rendas, uma vez que a alimentação e o vestuário continuaram a ser requisitados pelos mineiros e comerciantes das minas, em troca de uma riqueza estocada, mas que, por já não ser substituída, vai sendo drenada até provocar uma crise violenta a partir de 1766.

Há diminuição relativa da entrada de animais de carga em Minas desde a década de 1770, o que seria tentativamente explicado pela queda do nível do comércio interno da Capitania, decorrente da menor disponibilidade de moeda, isto é, de ouro em pó. Na tabela 2, estimamos a quantidade de viagens de animais necessárias para o transporte das importações de mercadorias na capitania. As  entradas eram anotadas em cargas, termo
genérico que pode tanto significar a carga total de um animal quanto apenas uma arroba. Este exercício de estimação das viagens de animais necessárias ao transporte das importações da capitania revela que o setor  mercantil demandava milhares de animaisanualmente. Além dos animais envolvidos na importação, outro tanto trafegava nos circuitos internos de abastecimento. As estimativas para o período posterior a 1780, quando as
atividades de abastecimento arrefeciam-se em conseqüência da decadência da mineração, sugerem números ainda maiores para o período anterior.


Visando estimar a participação da demanda mineira no total do mercado de animais de carga do sul, utilizaremos informações geradas pelas unidades fiscais presentes nas rotas que buscavam os distritos mineradores, encarregadas da tributação deste fluxo comercial. Esta documentação registra a movimentação de animais soltos na entrada das capitanias de
São Paulo e Minas Gerais e também na região de Sorocaba, onde parte das tropas era comercializada. Embora a recorrência de fraudes prejudique a confiabilidade das séries históricas geradas por estas fontes quantitativas oficiais, elas representam estimativas mínimas para a composição das tropas, além de, eventualmente, microdados tais como procedência, local de invernada, nomes de tropeiros, proprietários e fiadores dos animais.

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A criação do registro de Curitiba  circa 1730 define a disponibilidade de fontes quantitativas primárias oficiais sobre o trânsito de animais oriundos do sul do Brasil. As famosas feiras de Sorocaba iniciaram-se após a criação do registro na mesma vila, em 1750, o qual passou a atuar conjuntamente com o de Curitiba na fiscalização. Instituiu-se sistema de arrecadação em duas etapas: emitia-se uma  guia em Curitiba e novamente os animais eram contados em Sorocaba, onde normalmente pagavam os direitos. Prevenia-se o descaminho exigindo a declaração de um fiador à tropa, caso contrário esta não poderia prosseguir viagem; o fiador, normalmente morador da região, seria responsabilizado pelo pagamento em caso de descaminho. A maior parte das tropas fazia invernada na região de Sorocaba, onde eram negociadas e então  conduzidas aos mercados consumidores. Infelizmente, a documentação gerada por estes registros no período colonial foi pouco preservada. A Tabela 3 sumariza o volume de animais conduzidos pela capitania de São Paulo de acordo com as fontes conhecidas, salvo omissão.

Após sua passagem por Sorocaba, as tropas com destino a Minas Gerais eram conduzidas ao vale do rio Paraíba, onde descansavam antes de subir a serra e adentrar a capitania montanhosa. Neste caminho, principal via de acesso a Minas Gerais na primeira metade do século XVIII, situava-se o registro da Mantiqueira. Os registros na fronteira de Minas Gerais desempenhavam várias funções, dentre elas a cobrança de direitos de entrada, que oneravam “cada cavalo ou besta muar que entrasse sem carga, sem sela, em pelo e não montada” em 2 oitavas de ouro, ou 3$000 réis.

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A partir dos registros de cobrança de direitos de entrada compulsados por Ângelo Carrara (1997, pp. 157-185), podemos observar o volume de animais ingressos na capitania de Minas Gerais, conforme transcrito na tabela 4. Infelizmente, não coincidem os anos em que há dados da oferta (Curitiba e Sorocaba) e da demanda (registros mineiros), exceto 1766 e 1767 (parcial). Desconsiderando os problemas de comparação de dados de fontes diversas
(ainda que produzidas por unidades fiscais similares), tais como o tempo de viagem entre Curitiba e Mantiqueira, o resultado pode ser considerado satisfatório. Entre dezembro de 1765 e setembro de 1767, foram registrados 2.630 cavalos e 600 éguas em Curitiba; no biênio fiscal 1766/67, entraram em Minas Gerais, pelo registro da Mantiqueira, 2.626 cavalos. Estes indícios sugerem que Minas respondia pela quase totalidade do mercado de animais de carga do sul do Brasil em meados do século XVIII.

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Até o terceiro quartel do século XVIII era maior o número de cavalos envolvidos notransporte de cargas. Entretanto, as bestas  apresentavam vantagens, especialmente as sulriograndenses. A carga usual de uma mula em Minas Gerais regulava em 6 a 8 arrobas (90 a 120 kg). Animais grandes, “burros de São Paulo”, agüentavam até 12 arrobas (180 kg).


A quantidade de mulas conduzidas ultrapassou definitivamente a de cavalos entre 1775 e 1778. As fontes revelam substituição gradual, à exceção de meados da década de 1760, quando o registro de Curitiba aponta maior proporção de mulas, apesar das entradas em Minas neste período registrarem apenas cavalos. De fato, há queda na condução das duas
espécies nesta década na comparação com as evidências de 1751 e 1754.

Os criadores de cavalos sentiram o impacto da substituição. Carta régia de 19 de junho de 1761 ordenava a extinção da raça muar nas capitanias centrais “por fazerem moradores dela(s) os seus transportes em machos e mulas deixando por isso de comprar os cavalos, de sorte que se vai extinguindo a criação deles, por não terem saída, em grave prejuízo de meu real serviço e dos criadores, e bem comum dos lavradores dos sertões da
Bahia, Pernambuco e Piauí; e atendendo ao que por eles me foi representado” fossem mortos os animais desta espécie encontrados após  a sua publicação. Os criadores dos “currais do São Francisco” foram mais afetados pela introdução do gado muar em Minas Gerais e Goiás do que pela oferta de cavalos do sul. Protestos dos envolvidos no negócio de mulas, assim como a persistência do comércio sob a forma de contrabando, ensejaram a revogação da ordem real por intermédio de nova Carta Régia de 22 de dezembro de 1764. No que se refere aos registros oficiais, parece razoável supor que a aplicação desta medida real tenha conduzido à diminuição das movimentações de tropas de muares vindas do sul, explicando a total ausência de menção a muares nas entradas de Minas em 1765-1767.


O rebanho de muares crescia no sul e também no planalto central do Brasil, onde principiavam cruzamentos de éguas do país com burros importados do reino. Alguns documentos compulsados por João Dornas Filho (1957, pp. 100-102) e José Alípio Goulart (1961, pp. 52-54) ajudam a esclarecer a celeuma da época. A concorrência imposta pelos novíssimos rebanhos mineiros aos antigos criadores e negociantes do mercado platino levou
o governador de São Paulo, D. Luis de Sousa, a relatar em ofício ao vice-rei marquês de Lavradio, em 1773, que as bestas “da província de Viamão (...) costumavam vender à dobra e às vezes por maior preço atualmente me  consta que lhes não passa de 6$000”. Ora, a cobrança de direitos de entrada no valor de 3$000 pelos registros de Minas Gerais deve ter inibido sensivelmente a oferta de bestas  do sul. Mais ainda, a metrópole incentivava
explicitamente a criação em Minas, conforme carta-régia de 2 de dezembro de 1774 que mandava “promover nesta Capitania [MG] a  criação de bestas muares em utilidade dos vassalos, e em beneficio do comércio”. A  questão da concorrência entre o gado muar mineiro e o sul-riograndense não tomaria vulto não fosse a política fiscal da metrópole, que, no afã de arrecadar o ouro das minas, instaurou taxa que protegia a criação mineira.

Os dados para 1788-99 apontam manutenção da quantidade de muares entrados em Minas pelo registro da Mantiqueira desde 1772-73, apesar de diminuição superior a 95% da quantidade de cavalos. De outro lado, o volume total de animais de carga negociados na feira de Sorocaba em 1779/82 é similar  ao conduzido por Curitiba em 1769/71, tendo duplicado a quantidade de muares e diminuído  à metade a de cavalos. Parte da demanda mineira por bestas de carga estaria sendo  suprida por criação própria. Em 1788 “o Rio Grande de São Pedro ainda tira, posto que em muito menor quantidade, vantagem da introdução de bestas muares em Minas Gerais”. Os rebanhos do sul enfrentavam concorrência, pois “a raça muar se desenvolveu e se apurou de tal forma no planalto central do Brasil, que não tardou Minas se colocar no primeiro plano dos seus criadores, conseguindo até tipos distintos de reprodutores, como os do padre Manoel Torquato de Almeida, em Camapuã, com a raça oriunda do jumento ‘Nero’, produto de alta mestiçagem de raças italianas e egípcias, em 1810”. Este relato pode iluminar algumas das razões da queda na entrada anual de muares em Minas na primeira década do século XIX, apenas metade do volume verificado na década anterior.

III – O PERÍODO IMPERIAL: NOVAS FORMAS DE INSERÇÃO

A comercialização de bestas de carga  do Rio Grande no centro-sul do Brasil não arrefeceu com a decadência da mineração nas últimas décadas do século XVIII e subseqüente acomodação econômica ao hinterland do Rio de Janeiro. A manutenção da um sólido setor mercantil na distribuição das importações, assim como a exportação de novos produtos coloniais como o açúcar, contribuiu para manter a demanda por animais em trajetória ascendente. As exportações paulistas em 1813 ocuparam 91.000 viagens de bestas do planalto paulista aos portos, mais próximos dos centros produtores do que no caso mineiro. Neste ano, os “meios direitos de Curitiba” foram consolidados em 25:665$532 rs. (ESCHWEGE, 2002, p.276), correspondendo à entrada de mais de 20.000 animais na capitania de São Paulo.

No primeiro quartel do século XIX, as entradas de mulas em Minas representavam uma pequena parcela do mercado. Segundo Saint-Hilaire, a oferta no mercado de Sorocaba atingiu 18.000 cabeças em 1818, situando-se em torno de 20.000 nos anos anteriores; por sua vez, os registros mineiros contabilizaram menos de 1.500 bestas novas entradas em 1818/19. Em contrapartida, neste ano foi registrada a exportação de 3.625 bestas de Minas para a Bahia, computadas pelo registro do Rio Pardo . Desta forma, as fontes oficiais apontam para o auto-suprimento mineiro da oferta de mulas.

O tráfego nas vias interprovinciais de Minas não era desprezível, e aumentou
durante a década de 1810. Em relato de 1811, o Barão de Eschwege afirma que “o frete comum do Rio para Vila Rica costuma ser de 1.000 réis por arroba – o frete de Vila Rica para o Rio é em geral apenas 800 réis, por  não ser tão procurado,  por causa da falta de artigos de exportação”. Já em nota introduzida na edição de 1824, Eschwege afirma que “o frete de Minas para o Rio custa agora, por causa da maior exportação de diversas mercadorias, tanto quanto o do Rio para Minas”. Em 1821, afirma João Severiano da
Costa, futuro Marquês de Queirós, que “pelo menos 2.000 bestas andavam empregadas no transporte do Rio de Janeiro para Minas”. A citação corrobora os dados oficiais. Cada besta faria 12 viagens por ano desde o Rio de  Janeiro até algum ponto em Minas, com importações; voltava com os gêneros da terra para exportação e abastecimento da Corte. Para 1818/19 estimamos a necessidade de cerca de 25.000 viagens para o escoamento das exportações mineiras via Caminho Novo, sendo 33,3% deste total com algodão e 33,7% com toucinho. Nos demais caminhos interprovinciais, as exportações averiguadas nos registros ocupariam outras 28.000 viagens – com toucinho (33,6%), fumo (26,1%), queijos (16,1%) e algodão (11,1%).

Para a década de 1830, a única informação disponível sobre importações de mulas de Minas Gerais não parece confiável. O comentarista inglês Sturz as estima em 50-70.000 por ano. Os dados de Herbert Klein situam os animais negociados em Sorocaba nesta década na média de 19.308. Entretanto, com a criação do imposto sobre bestas novas, nova modalidade fiscal estabelecida por meio da lei n 154 de 1839 da província de Minas Gerais, passou-se a registrar de forma mais confiável a entrada de mulas soltas em território mineiro. Esta taxa era cobrada nas recebedorias de fronteira
(antigos registros), criadas também por intermédio da supracitada lei. Informações sobre a receita oriunda de sua arrecadação estão disponíveis em relatórios dos presidentes da província de Minas e também nos encadernados de Tabelas da Mesa  de Rendas Provinciais e Balanços e Orçamentos apresentados à Assembléia Legislativa Provincial de Minas Gerais, encontrados no Arquivo Público Mineiro.

Embora houvesse criação de mulas em Minas Gerais, as do sul do país eram preferidas por sua maior força e resistência. Uma besta capaz de carregar 150% do peso ordinário atribuído poupa não somente o emprego de mais bestas, como também o pagamento de taxas nos postos fiscais, que contabilizavam um peso padrão por cada besta. A lei nº 154 de 1839 estabeleceu as taxas de exportação, a respeito das quais afirma o Inspetor
da Mesa das Rendas Provinciais de Minas Gerais, em relato de 1855: “os Administradores das Recebedorias, na conformidade dos Regulamentos, calculam em 8 o número de arrobas [de café] que carrega uma besta, quando do ordinário sobre cada uma pesa não menos que10”.

A compilação das informações presentes  na herança documental das unidades fiscais responsáveis pelo registro da entrada de muares nas províncias de São Paulo e Minas Gerais permite que elaboremos uma estimativa da participação da demanda mineira no total de muares trazidos do sul em direção à região central. Para tanto, utilizaremos os registros
do imposto sobre bestas novas, mencionados acima, e também a documentação do registro do Rio Negro e da barreira de Itapetininga, responsáveis pela arrecadação dos direitos sobre animais na província de São Paulo. O primeiro, situado no extremo sul da quinta comarca da
província, desempenhou esta função no período 1830-54. A partir de então, com a emancipação da província do Paraná, as guias para recolhimento dos direitos passaram a ser emitidas na barreira de Itapetininga, situada próxima à fronteira da província de São Paulo com a recém-emancipada província do Paraná. A barreira registrou as entradas de animais soltos em São Paulo até o ano de 1869.

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A tabela 5 apresenta lado a lado o volume total de muares registrados na entrada de das províncias de São Paulo e Minas Gerais nos anos em que há disponibilidade de dados para ambos os casos. A documentação das recebedorias mineiras registra apenas a entrada de muares, não sendo possível  analisar de forma semelhante a movimentação de outros rebanhos de animais de carga (em especial  cavalos, também registrados na documentação paulista).

Entre 1839 e 1843, período em que apenas  encontramos informações agregadas sobre as entradas na província de Minas Gerais, a taxa sobre bestas novas computou 13.211 animais, média de 3.303 por ano. Estes números correspondem a pouco mais de 10% do volume de muares entrados na província de São Paulo. Já em 1844/45 observamos um aumento da participação mineira na demanda por muares, que alcança aproximadamente 15%, estabelecendo-se em um patamar superior aos 20% já no início da década de 1850. Durante todo o período em que dispomos de  dados completos, a participação mineira no total de muares ingressos em São Paulo apenas será inferior  a 20% no ano financeiro 1861/62, atingindo em alguns anos de pico mais de 50% deste total.

O aumento na demanda mineira por animais de carga na década de 1850, quando esta volta a absorver importante parcela dos negócios na feira de Sorocaba, coincide com o aumento expressivo das exportações de café  da província de Minas Gerais. Conforme podemos observar na tabela 6, não é apenas o número de animais envolvidos na exportação de produtos mineiros que aumenta sensivelmente durante as décadas de 1850 e 1860; a parcela destes animais utilizados nas exportações de café cresce concomitantemente durante o período, estabilizando-se em um patamar próximo aos 75% até as proximidades do fim do período imperial. Reforçando ainda mais a idéia de que o transporte de café era o principal emprego das mulas, vale destacar que, durante o qüinqüênio 1856/60, do total de bestas novas afiançadas – aquelas não  pagas pelo condutor na entrada da província, e sim pelo importador à coletoria municipal –, 83% eram demandadas por residentes do “Centro”, região que, segundo divisão fiscal da época, incluía a zona da Mata do café em expansão.

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A documentação da barreira  de Itapetininga apresenta algumas informações de natureza qualitativa, entre elas o local onde as tropas serão invernadas após a passagem pela barreira. Há registro inclusive de algumas tropas que indicam localidades mineiras como seu local de invernada, evidenciando que parte dos animais ingressos na província de São Paulo já tem como destino prévio o mercado consumidor mineiro. Durante todo o período de atuação da barreira (1854-1869), dentre as  tropas não destinadas à venda imediata, 33% indicavam alguma localidade do oeste paulista como sua estação de invernada. Ora, a documentação das recebedorias mineiras indica que 94,2% das bestas novas registradas no período 1839-1884 ingressaram em território mineiro pelas recebedorias localizadas na fronteira com o oeste paulista.


As tropas adentravam Minas por diversas rotas, em caminhos tributários da estrada de São Paulo para Goiás. Os registros  da taxa de bestas novas distinguem-se por recebedorias em 27 anos fiscais entre 1839 e 1884. O movimento de tropas de mulas xucras é distribuído nas recebedorias de Caldas (ou Samambaia, 26,5%), Jaguari (19,7%), Campanha de Toledo (18,1%), Ouro Fino (11,5%), Jacuí (ou Monte Santo, 7,9%), Cabo Verde (ou Guaxupé, 4,6%), Santa Bárbara (ou Jaguara, 4,3%) e Ponte Alta (ou coletoria de Uberaba, 1,5%).

Uma vez em Minas, as tropas “procuravam São João Del Rei. Ali (...) foi centro de comércio de animais. Seus habitantes eram numerosos em Sorocaba. Reciprocamente, sorocabanos vendiam suas tropas na comarca do Rio das Mortes”. Estas evidências apontam para uma possível rede secundária de fornecimento de muares para a província de Minas Gerais, talvez até mesmo organizada de forma independente da feira de Sorocaba.
Reforçando a evidência, temos o testemunho de Aluísio de Almeida sobre esta rota de comércio entre São Paulo e Minas Gerais, a respeito da qual afirma:

As tropas adquiridas em Sorocaba continuavam até uma encruzilhada (...) de um lado – subindo a serra – a São Paulo e, de outro, para Itu, onde havia pessoas dedicadas a negócios com tropeiros, e daí a Jundiaí. Nesta vila especialmente eram tropeiros de tropa arreada, alugadores e vendedores de bestas. De então para adiante era a estrada para Goiás (...). A direita de Jundiaí um ramal levava ao sul de Minas, pelo Registro de Jaguari. (...) No planalto paulista, terminados seus negócios, abalam-se no vale do Paraíba. (...) Muitos iam direto ao Rio de Janeiro (...). Enfim, vão escalar a Mantiqueira, atravessando o Paraíba além de Lorena atual e subindo a Serra do Picau.

Mario Rodarte e Marcelo Godoy mapearam as atividades de “comércio de tropas” em Minas Gerais na década de 1830 de acordo com os dados demográficos das listas nominativas. Seus resultados indicam que a atuação dos tropeiros era mais intensa nos núcleos de maior centralidade urbana e  no seu entorno, “principalmente quando estes assumiam a função de entreposto comercial”, como era o caso de São João Del Rei.

Ao longo do século XIX, a pujança do setor exportador de café deixa a importância comercial sanjoanense em segundo plano. Entretanto, a vila prosseguiu desempenhado seu papel como centro distribuidor de importações de todos os tipos, inclusive animais de carga. Atividade extremamente lucrativa, em 1854 as importações de bestas muares somavam 150 contos de réis e as reexportações 225 contos de réis, em São João, sendo que ali não havia criação para o mercado.

As mulas de criação mineira não afetavam a demanda por bestas fortes do sul do país. Os preços do gado muar nos mercados regionais mineiros eram regulados pela oferta de animais de melhor qualidade. Segundo um mapa demonstrativo dos preços, em 1839/40, de cinqüenta e um produtos da terra mineira em dezenove localidades diferentes, os preços dos muares em Minas apresentavam o quarto menor desvio-padrão relativo ao preço médio. Os maiores preços absolutos eram encontrados em áreas ligadas a ramificações secundárias de comercialização das “bestas paulistas”, como a zona da expansão cafeeira (Barbacena e Aiuruoca) e a região média do rio das Velhas e São Francisco, na estrada geral do centro antigo minerador para os sertões (Santa Luzia e Januária).

O estudo dos preços, embora pouco conclusivo devido à própria precariedade da fonte, aponta para intrincado  esquema de comercialização de mulas dentro da província, com destaque para a região de São João como entreposto na rota das tropas de mulas soltas com destino à Mata, zona exportadora de produtos agrícolas. No centro minerador, tropas do sul mesclavam-se à criação própria, talvez de Minas Novas, que figurava como principal zona criadora e exportadora. Na rota dos currais, subindo o rio das Velhas, havia importantes feiras de animais em Santa Luzia.

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Uma quantidade não desprezível de muares era exportada anualmente pela
província de Minas Gerais, conforme podemos observar na tabela 7. Estes movimentos foram registrados em várias recebedorias mineiras, nas fronteiras com as províncias de São Paulo, do Rio de Janeiro e principalmente da Bahia. A maior parcela das exportações mineiras ocorreu por meio da recebedoria de Rio Pardo, região de Minas Novas (99,9% em 1819 e 60,6% em 1839/84). Curiosamente, alguns dos registros de passagem da barreira de Itapetininga apresentam proprietários de tropas que indicaram esta região como seu local de residência, comprovando mais uma vez a amplitude e complexidade desta rede de abastecimento de animais. Todavia, dada  a expressividade da criação de muares em território mineiro durante o século XIX, torna-se difícil estabelecer a parcela destes fluxos de exportação que corresponde a reexportações de animais vindos do sul.


Visando apresentar de forma mais clara  as flutuações do mercado de animais durante o período imperial, os números compilados na tabela 5 são representados no gráfico 1. Ao contrário da tabela 5, são ali incluídas séries completas de entrada em Minas e São Paulo, não restritas apenas aos períodos em que há coincidência nas informações. Além disto, o gráfico também apresenta a série  compilada por Herbert Klein a partir da
documentação do registro de Sorocaba. Esta série difere dos dados de entrada na província de São Paulo apresentados na tabela 5 por captarem a movimentação no próprio local de comercialização das tropas. Desta forma, os números de Klein estão relacionados mais diretamente com a demanda por muares, enquanto que os volumes compilados a partir da documentação de Rio Negro e Itapetininga representariam a oferta destes animais.

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Podemos perceber que os movimentos cíclicos das três séries são bastante
similares, o que indica que a demanda mineira segue, em linhas gerais, o comportamento do mercado de muares como um todo. O que diferencia as séries é a intensidade das flutuações, muito mais pronunciada no caso da entrada  de muares em São Paulo do que em Minas Gerais e Sorocaba. O fluxo de entrada em  Minas parece acompanhar mais de perto a
movimentação de Sorocaba, onde a demanda exerce influência mais imediata. Isto explicaria a baixa participação mineira nas entradas do ano financeiro 1861/62. Deflagrando-se uma crise de demanda neste ano, confirmada pela queda no volume negociado em Sorocaba, a oferta de animais não teria se ajustado adequadamente a tempo, resultando em uma queda ainda mais brusca no ano seguinte. Infelizmente, os dados de entrada em Minas falham justamente neste importante período, porém a tendência da demanda mineira parece ser de acompanhar esta quebra.


A correspondência entre as séries de Minas e Sorocaba – ou seja, entre a demanda mineira e a demanda total do mercado – é natural caso os principais consumidores das novas bestas ingressas em território mineiro sejam, de fato, os exportadores de café da zona da Mata, conforme hipótese apresentada anteriormente. Levando em consideração que os principais consumidores de muares em São Paulo são também os exportadores de café, seria esperado que as flutuações das demandas paulista e mineira apresentassem padrões similares.

Os períodos em que a demanda mineira obteve maior proporção das bestas
negociadas em Sorocaba foram 1851/56 (45,8%), 1867/72 (44,8%) e 1877/78 (71,1%). Em pelo menos quatro anos a quantidade entrada em Minas Gerais foi superior à total destinada a outras províncias: 54/55, 67/68, 71/72  e 77/78. Em 1881-1884, quando o registro de Sorocaba está desativado devido à retração do mercado da feira, ainda entram mais de 1.000 bestas anualmente, em média, em Minas Gerais. Este aumento na participação relativa da demanda mineira com a proximidade do fim do período imperial certamente está relacionado com a expansão da malha ferroviária na província de São Paulo, que deslocou a demanda por animais de carga para locais mais afastados da fronteira agrícola, no oeste da província.

A penetração das ferrovias fluminenses a partir da década de 1870 também fez com que a demanda mineira por bestas fortes do sul do país caísse de sua média histórica de cerca de 14.200 animais por ano em 1852/73 para 6.300 em 1873/80. Este processo também fez caducar a cobrança de taxas itinerárias, dado que as importações passaram a penetrar em Minas dentro de vagões. A redução no rendimento das taxas sobre animais com importações conduz, a partir da década de 1880, à extinção desta modalidade tributária, retornando a cobrança de direitos de entrada sobre o peso, como praticada até a década de 1830. Em 1881/84, das 14.381 toneladas de cargas e  13.126 toneladas de alimentos importados
anualmente, em média, por Minas, 84,1% e 96,7% pagaram a taxa nas recebedorias marginais às estradas de ferro, respectivamente. O transporte no lombo de bestas estava confinado, a partir de então, a áreas longínquas e de difícil acesso, ou então ao cumprimento de pequenos trajetos que separavam os núcleos populacionais das estações ferroviárias. O ciclo do muar chegava a seu termo, esmaecendo juntamente com o impulso de demanda das Minas Gerais, que lhe dera origem e o  acompanhara de perto durante todo o seu desenvolvimento.

Autores: Carlos Eduardo Suprinyak e Cristiano Corte Restitutti